O segredo de Chez Chouette
Chama-se António L. Xavier, tem 24 anos, e é o novo chef do restaurante no bairro de Alvalade, aberto há um ano. Uma passagem de pasta do chef alentejano Leopoldo Garcia Calhau.
Um sítio nunca é só uma morada com um nome e um menu. No caso, queremos dizer que o Chez Chouette não é só mais um restaurante na cidade a fazer pratos esteticamente apelativos para inglês ver. Este restaurante em Alvalade, cuja cozinha estava até há pouco tempo nas mãos do já bem conhecido chef Leopoldo Garcia Calhau, é uma paragem obrigatória e a razão é… o novo chef. É que António L. Xavier, aos 24 e vindo do Porto, é uma verdadeira caixa de surpresas, com uma trajetória feita de reviravoltas e aventuras sucessivas. Estamos tentados a perguntar-lhe onde se vê daqui a dois anos, depois de nos expor o seu extenso currículo para seis anos de atividade, mas a verdade é que queremos continuar a provar os seus pratos no 20 A/B da Rua Acácio de Paiva, em Lisboa.
António L. Xavier estava a estudar Direito, por insistência dos pais para que fizesse um curso mais conservador, quando ao fim de um ano e meio não aguentou – "enquanto escrevia ‘desisto’, a meio de uma prova, pensava no que faria para jantar" -, conta, sem remorsos, quando decidiu começar a fazer catering premium. (É preciso dizer que nesta história, os pais de António são ambos de Coimbra e cozinheiros de mão cheia – o pai, porque viajou pela Europa e regressou a fazer bifes tártaros e três pimentas, camparis e negronis como poucos, o que na altura era uma novidade, numa cidade muito pouco cosmopolita que era; a mãe é especialista em pratos mais tradicionais). "Até hoje, o meu pai é o meu maior crítico, se odeia ele diz-me: ‘isto está horrível!’."
Nota-se que põe muito da família naquilo que faz, e que são eles o seu motor (tem mais três irmãs). Quando se dedicou ao catering, começando a fazer dinheiro rápido, o pai avisou-o: "não pode ser só copos e trabalhar duas vezes por semana". Tinha 19 anos quando foi estagiar no Bocca, onde na altura Diogo Formiga do Encanto chefiava a cozinha; ainda passou pelo Flow, onde serviam 200 jantares por dia - ambos no Porto; e logo em seguida acabou por rumar uma primeira vez a Lisboa para aprender na cozinha no Avillez. "Foi a experiência mais dura da minha vida, há quem desista ao primeiro dia, só ao fim de um mês começou a ser ligeiramente menos difícil." Não desistiu, nem aí nem na Le Cordon Bleu, em Londres, para onde foi antes, durante e depois da pandemia, concluindo o dificílimo curso de cozinha desta reputada escola (pelo meio fez um curso de vinhos com Manuel Moreira). "Não queria hotelaria, porque me dispersava muito, queria aprender as verdadeiras bases da cozinha." Ainda esteve no Boubou's com a chef Louise Bourrat, e um ano no Portie, no Porto, onde assumiu pela primeira a cozinha de um restaurante sozinho, mesmo antes de o Leopoldo Garcia Calhau o pescar para o Chez Chouette, onde o encontramos agora a fazer muitos pratos com influência da cozinha francesa, precisamente, mas com a sabedoria crua dos ingredientes nacionais.
É por isso que carapau braseado com molho de vinho da Madeira (€11) é uma das estrelas da carta, ao lado de outros como camarão violeta com xerém crocante (€26) ou alho francês com molho béarnaise (€11). "Não se põe nada no prato que não tenha sabor, foi uma das coisas que aprendi no curso". Entre os nossos preferidos, estão o arroz de algas com corvina (€17): "vou ao mercado de Alvalade comprar tudo o que é fresco, como a corvina, um peixe que é delicioso" – mas também o folhado de bochecha de novilho (€18): "fiz 150 bifes Wellington no catering e estava farto, já nem o cheiro podia tolerar", diz, sempre com um sorriso, quando lhe perguntamos por semelhanças com este famoso prato.
Tudo isto é servido numas mesas altas com bancos a condizer - que em breve serão substituídas – sem nunca tirarmos os olhos da altíssima estante de vinhos com mais de 100 referências de vinhos portugueses, espanhóis e franceses, com foco no Alentejo, no Dão e em Borgonha. Nas paredes há quadros do projeto Manicómio, à venda, de um lado. Os cuidados nos detalhes brilham: as louças em que comemos são Costa Nova, mas também as há das marcas Ghome, Studio Neves, Aquiles, Cécile M. e Margarida Fábrica.
A história preferida fica para o fim, e voltamos à família. "A sobremesa de bolo de bolacha é inspirada na minha avó, que a fazia assim, sem camadas, porque o meu avô não gostava no creme." É uma bela (e fresca) surpresa, tal como a tarte tatin de pêra (ambas €6, cada), deliciosa, e que dissipa qualquer dúvida, se ainda houvesse: certamente conheceremos deste jovem chef mais pratos com este cunho afrancesado. Uma bela dança gastronómica entre ambas as cozinhas, portuguesa e francesa, assim é o Chez Chouette.
Onde? Rua Acácio de Paiva, 20 A/B Quando? Segunda e quinta-feira das 18h30 às 23h; sexta e sábado das 12h às 15h e das 18h30 à meia-noite; domingo das 12h às 18h, Encerra terça e quarta-feira. Reservas 214 098 817
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