Quinta de Baixo, um laboratório de grandes vinhos
Dirk Niepoort disse-o várias vezes, "a Bairrada sempre foi a minha grande paixão”, e foi na Quinta de Baixo que colocou todo o seu amor. E o filho Daniel.
Sérgio Silva, o enólogo da Quinta de Baixo recorda-se como ouve muitas vezes 'isso aí parece uma casa de maluquinhos'. "Malucos talvez", responde-lhes, "mas daqueles inteligentes. É por isso que a Niepoort tem o sucesso que tem em mais de oitenta países". Só lhe faltou terminar com um "Tomaaa!", mas percebemos o orgulho.
Na verdade, o primeiro a admitir a loucura pela Quinta de Baixo foi o próprio Dirk Niepoort: "Fiquei maluco", disse com o seu jeito sempre jovial e entusiasta, perante a oportunidade de a adquirir. Isto há uma década.
Com 25 hectares, a Quinta de Baixo está localizada numa espécie de triângulo dourado que representa o melhor da Bairrada. Tem várias parcelas de vinhas velhas, ou muito velhas, com mais de 60 e 80 anos, plantadas com as típicas castas bairradinas, a Maria Gomes, Bical ou Cercial, nas brancas, e a Baga nas tintas. Um laboratório perfeito para a equipa da Niepoort fazer aquilo que mais gosta, ou seja, pegar em castas antigas e fazer vinhos com pouca concentração, menos álcool, e mais acidez, o que lhes confere um perfil muito gastronómico. Vai contra o passado recente da viticultura portuguesa, mas, afiança Dirk, "está muito mais perto daquilo que se fazia antigamente".
O filho mais velho de Dirk, Daniel, que entretanto assumiu a direção de enologia do grupo concorda: "a prova de que um bom vinho não tem que ter muita cor ou muito álcool", diz "é o Drink Me NatCool. É um daqueles vinhos que apetece sempre beber mais um copo, por isso é vendido em garrafas de litro, porque uma das normais não chegava."
"É verdade que há muitos produtores que gostam de fazer vinhos com concentração e álcool, mas nós queremos mostrar às pessoas que nesta região também é possível fazer vinhos bastante gastronómicos e frescos", acrescentou ainda.
Recorrem, assim, a toneis de 2500 litros, para que a madeira marque muito pouco os vinhos, e colhem as uvas umas semanas mais cedo, para preservar a acidez natural da uva, e manter o teor de álcool mais baixo. Atualmente há muitos produtores em Portugal que o fazem, também, mas há uma década não era assim tão usual. Agora, o que ainda continua a fazer muita confusão a muita gente é a aposta na biodinâmica − o que aconteceu desde a primeira hora, trazendo inclusivamente um dos gurus mundiais, o professor norte americano Andrew Lorand, a passar umas temporadas na quinta para estudar a melhor forma de implantar o conceito.
Como princípio, a biodinâmica rejeita tudo o que são pesticidas químicos, fungicidas ou herbicidas. Para manter a saúde nas vinhas a aposta passa sobretudo pela biodiversidade, em manter um ecossistema vivo à volta da vinha, que é muto mais eficaz a prevenir pragas e outras doenças do que muitos químicos. Até aqui, basicamente, é tudo igual à agricultura biológica e, aliás, o primeiro tratado de agricultura biológica, formulado em 1924 por Rudolf Steiner era, na realidade, sobre biodinâmica. Mas depois a Biodinâmica leva este conceito um pouco mais longe, adotando práticas mais "maluquinhas", como enterrar cornos de vaca na vinha, pulverizar as videiras com dejetos, ou decidir os momentos para plantar, podar, mondar e até vindimar pelas posições dos astros.
Os Niepoort explicam. "Se fores falar com os mais velhos, e lhes perguntares como é que faziam os seus pais e avós, percebes como todos estes trabalhos na vinha se faziam sempre nas mesmas alturas – ou no dia de um santo, ou de uma efeméride qualquer. Pegas no calendário e são exatamente as mesmas datas que a biodinâmica defende. Não pode ser por acaso".
Basicamente, não são negacionistas, e ao conhecimento científico mais avançado juntam também este lado empírico, sem dogmas – malucos, mas "dos inteligentes", lembram-se?. A verdade é que há cada vez mais produtores em todo o mundo a acreditar nos benefícios de adotar estas práticas ou como diria Shakespeare (citação livre): "Há mais coisas entre o céu e a terra, Horatio, do que a sua filosofia consegue imaginar."
Os vinhos
O Natcool, branco, de que já aqui falámos, é uma excelente porta de entrada para os vinhos da Quinta de Baixo, mas há muito mais, como o surpreendente Caracolete, um branco (Maria Gomes e Bical) de vinhas velhas que esteve num processo fermentativo durante cinco anos, o que lhe valeu o nome.
O VV Vinhas Velhas Branco 2018 é um dos ex-líbris da Quinta. Um branco mineral, com notas de giz muito evidentes devido aos solos calcários. Frescura, acidez e elegância no seu melhor, sendo que ainda impressiona pela leveza, embora até seja encorpado. Estagiou 20 meses em fudres de 1000 litros.
Nos tintos, o destaque vai para este Poeirinho Garrafeira 2015. Poeirinho era o nome dado antigamente à casta Baga. Um vinho vibrante nos aromas, fresco (como sempre) e taninos muito polidos. Enorme complexidade e equilíbrio, vai muito bem à mesa.
Vinhos para provar com tranquilidade, dos 8 aos 300 euros
Numa altura em que as vinhas se começam a preparar para descansar, há novas colheitas e apostas recentes que passam, por exemplo, pelos Açores. Um rosé insular, um branco francês e outro de origem alemã, dois tintos a norte e um Porto com uma idade invejável.
Vinhos para contrariar o mau tempo e descontrair
Aproxima-se o tempo mais frio e as chuvas, que nesta altura são tudo menos “mau tempo”. Dois espumantes a Norte e a Sul, dois tintos com as mesmas latitudes, um Moscatel premiado e um branco com assinatura Reynolds.
Vinhos que assinalam o lavar dos cestos
Terminadas as vindimas em quase todo o país, é tempo de enologia onde as fermentações e estágios são preparados cuidadosamente. Uma estreia dos Açores, da ilha Terceira, com Adega dos Sentidos, ainda quatro brancos que percorrem o continente e um tinto de Mértola.
António Pinto, de empresário a produtor de vinhos: “Prefiro pagar o preço pela minha independência”
O empresário transmontano que fez carreira no Porto lançou-se como produtor de vinhos verdes há 18 anos. Devagar, sem se render às grandes superfícies, conquistou um lugar no mundo dos vinhos portugueses.
Vinhos para brindar ao outono dos €6 aos €900
A um dia de entrar em outubro, faz sentido celebrar o mês onde grande parte dos vinhos já foram vinificados com um espumante, neste caso, um blend rosé. Da mesma região demarcada dos verdes, um tinto, dois alentejanos e um do Tejo, também tintos, e uma edição rara de vinho do Porto velho.
Vinhos para surpreender (e alguns com potencial de guarda)
Na última semana do mês, o lançamento de um vinho do Dão que faz corar de vergonha os “reserva” que vão saindo todos os anos. Um transmontano com um posicionamento acima do comum, dois brancos do Alentejo e Douro, um tinto de Mértola e um espumante dos verdes.
Vinhos para beber com serenidade
A chuva ainda não se manteve neste mês, mas já assustou algumas vindimas que ainda se fazem pelo país fora. Dois monovarietais brancos do Sul e do Norte e um ‘blend’ duriense, um tinto de vinhas velhas transmontanas e dois mais jovens do Alentejo e Douro compõem a lista de sugestões desta semana.
No Convento do Beato, em Lisboa, premiou-se o talento nacional no que respeita à gastronomia, ao mesmo tempo que se assinalou o empoderamento feminino, com o cocktail e um jantar de gala exclusivamente criado por quatro chefs portuguesas: Justa Nobre, Ana Moura, Marlene Vieira e Sara Soares.
Das entradas às sobremesas, o sabor intenso da trufa d’Alba delicia o inverno no restaurante italiano, em Sintra.
Um Pinot Noir sem nada a temer dos borgonheses, um espumante que não é branco nem rosé, mas Baga, e três vinhos de terroir de vinhas muito velhas. A Casa da Passarella foi ao passado abrir caminho para os vinhos de amanhã, e o resultado é francamente especial.
Em novembro preparam-se as videiras para as chuvas e para o novo ciclo que se inicia. As folhas caem e a planta entra em hibernação antes de se iniciar a fase da poda. Para muitos, o mês mais tranquilo nas vinhas.