Obras do Brasil, México e EUA em exposição na Comporta
A Casa da Cultura da Comporta recebe 18 artistas contemporâneos, portugueses e internacionais, através de uma sinergia entre as galerias Fortes D’Aloia & Gabriel e kurimazutto, entre julho e agosto.
Dentro da Casa da Cultura, na Comporta, tudo dialoga. Notamos de imediato que as obras expostas comunicam entre si, comunicam sozinhas, comunicam connosco. Há uma espécie de workflow artístico, que Maria Ana Pimenta, diretora internacional da Fortes D’Aloia & Gabriel, nos irá confirmar mais tarde, nesta visita guiada ao preview da exposição. Esta é uma iniciativa desta galeria baseada em São Paulo e no Rio de Janeiro, que convidou a kurimazutto (México e EUA), a expor seleccionadas peças dos seus artistas na Casa da Cultura, durante os meses de julho e agosto. Ainda a exposição não inaugurou e já há olhares curiosos vindos da rua, a perguntar se podem entrar, numa tentativa de compreender o que se passa neste antigo celeiro de arroz reabilitado nos 1960, operando desde aí como cinema e centro cultural da região, e que hoje pertence à Fundação Herdade da Comporta.
Esta é a terceira edição desta iniciativa colaborativa, tendo a primeira acontecido em 2021, e a ideia nasceu da vontade da galeria Fortes D’Aloia & Gabriel em criar formatos de exposição fora dos circuitos tradicionais, mas também de criar mais projetos sinérgicos entre artistas. A kurimazutto é, assim, a terceira galeria convidada a estar presente, no seguimento do sucesso do formato adotado. "Nesta região havia falta de programas culturais, preenchemos um vácuo, nessa perspetiva, sentimos que há mais consumo de cultura, tanto de turistas como de locais" assevera Maria Ana Pimenta. "A kurimazutto é uma galeria com um perfil parecido com o nosso, até temos o Damián Ortega que ambos representamos, internacionalmente. Esta é uma exposição que parte da vontade de encontrar pontos de diálogo entre os artistas."
O artista convidado desta exposição é Álvaro Lapa, "quem admiramos muito, e que infelizmente é pouco reconhecido internacional, mas que é um artista histórico." Num misto de referências já expostas em Portugal e algumas inéditas, a exposição alinha os nomes de Leonor Antunes, Abraham Cruzvillegas, Anderson Borba, Álvaro Lapa, Gabriel Orozco, Wilfredo Prieto, Marina Rheingantz, Mauro Restiffe, Haegue Yang e Luiz Zerbini, para uma primeira parte - que inaugurou a 8 de julho e fica até 31 de julho -, e com obras de Adriana Varejão, Nairy Baghramian, Márcia Falcão, Sergej Jensen, Ernesto Neto, Damián Ortega, Sofía Táboas e Erika Verzutti numa segunda parte, a inaugurar no dia 5 de agosto.
Comecemos por falar na série "Fake News" (2021), de Wilfredo Prieto, que tem um quadro bem grande por cima da plateia (as cadeiras permanecem originais), que estabelece uma relação entre a cultura e a notícia, nascida do consumo voraz que o artista sentiu durante a pandemia. Prieto tem mais quadros inspirados nesta desconstrução da verdade, traduzida para pintura.
Marina Rheingantz tem um quadro feito de bordados, que parte dos trabalhos prévios da pintura que esta artista brasileira tem vindo a desenvolver ao longo dos anos. "Ela começou a desenvolver os bordados com a mãe, como as pinturas já tinham relação com técnica, pensamento e trama. A artista tem aqui exposto outro quadro, e chama-se Silverlake, com camadas que a artistas vai pondo e retirando, de forma intuitiva, com magenta e azul turquesa, quase se consegue sentir a temperatura da pintura", explica Maria Ana.
Há dois trabalhos expostos de Álvaro Lapa. "Um pintor que trabalhava a literatura, a palavra, a filosofia, criou uma simbologia própria e trabalhava sobre as mesmas séries vários anos." O artista expõe uma pintura de 1987, e outra da série Lâminas, de 2004. "A sugestão de espacialidade em Sem título (1970), da sua série Moradas, evoca um bilhete descartado ou um vale, e as referências e inclusão de palavras escritas sugerem trilhas narrativas em mutação."
Ao lado há uma peça da portuguesa Leonor Antunes, chamada Intersections. A artista resgata a arte do savoir faire, "trabalha com artesãos locais, vai buscar a ideia de a escultura não ser uma coisa estática, mas que interage no espaço de forma orgânica.
Gabriel Orozco, a viver entre Tóquio, México e Bali, e tem quatro peças para a exposição. Tem uma escultura feita com calcário - "Dé Fruit" (2017) - inspirada nas possibilidades das faces de um dado, que brinca com a geometria, e três aquarelas que são uma série que o artista produziu em Tóquio, a partir de telas douradas típicas do Japão, "importa-se com a organização do espaço dentro das aquarelas, brinca com o vazio e com geometrias, que o guião na construção das aquarelas. Relaciona-se com o resgate das culturas locais." A série chama-se "Suisai" (2016) e reflete o trabalho de Orozco que "revela ações cíclicas que se desenrolam na natureza enquanto fazem a mediação entre o geométrico e o orgânico, a quietude e o movimento."
Há, ao lado, uma fotografia do brasileiro Mauro Restiffe, que já expôs na Galeria Zé dos Bois. É uma fotografia - "2020" - feita durante a pandemia, que retratam a mulher e o filho de Restiffe. "O Mauro fotografa sempre a preto e branco, sempre em analógico, e elas têm uma textura de grão."
Ernesto Neto expõe desenhos do início da sua carreira, no final dos anos 90 do século passado, com formas orgânicas, "retrata o útero, uma forma uterina, são desenhos que retratam o trabalho do artista ao longo da sua carreira."
O brasileiro Anderson Borba, ao lado, o artista dedica-se à escultura e tem aqui uma exposta, em parede. "As cores não são pintadas, sao revistas impregnadas na madeira, queimadas e envernizadas, criando um arranjo cromático artificial." Uma pintura que se chama "Mata-Leão [Rear Naked Choke]" (2022).
Luiz Zerbini, da coletiva musical Chelpa Ferro, também é pintor e escultor e tem aqui uma grande tela - "Musa Miraculosa" (2023). "Opera entre geometria e uma coisa completamente figurativa, bucólica, nesta pintura retrata as plantas que o rodeiam no seu jardim, até ao ponto de se verem as linhas originais do quadro, percebemos que era para ser uma coisa diferente."
Para finalizar, a sul-coreana Haegue Yang, explora o "encontro entre o artesanal e o artificial, através de uma cesta, feita manualmente, com plantas e uma inserção artificial." Chama-se "The Intermediate— Antenna Basket on Rings" (2017). "A antena de televisão, destacando -se entre as plantas, dá forma à dualidade entre o natural e o tecnológico."
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