Art Restaurant, onde a bola de Berlim é um manifesto artístico
À partida, o interior deste restaurante não convida ao consumo dessa iguaria pasteleira que tem a praia como habitat natural. Mas as aparências iludem. Além disso, esta não é uma bola de Berlim qualquer. Não tem açúcar, nem creme pasteleiro, e o seu recheio é um inesperado camarão.
Fomos conhecer o Art Restaurant no dia em que começaram as Festas de Cascais, também conhecidas como Festas do Mar. O que significa que a vila, normalmente tranquila, apesar dos muitos turistas e veraneantes, estava virada do avesso. Trânsito cortado, carros de polícia, pessoal da organização a montar os palcos, roulottes de churros, cachorros e piña coladas… Uma confusão. E um sol abrasador. Mas, a verdade é que até podia estar a chover línguas de fogo que nada nos impediria de ir almoçar ao Art naquele dia. O convite era demasiado tentador: continha cinco palavras mágicas e quase hipnotizantes – "bola de Berlim de camarão". O quê?! Isso mesmo. E acredite, leitor, que compreendemos o seu espanto. Bola de Berlim e camarão, no mesmo prato, parece, no mínimo, um sacrilégio gastronómico capaz de fazer Gordon Ramsay a gritar impropérios que fariam corar um estivador, e, no máximo, uma grande dor de barriga. Mas sabe o que lhe dizemos? É uma maravilha de lamber os dedos.
Agora que temos a sua atenção, voltemos ao início. O Art é o restaurante do Artsy Cascais, um hotel boutique de cinco estrelas no Bairro dos Museus, junto à Cidadela, ao Centro Cultural de Cascais, à Casa das Histórias da Paula Rego e ao Jardim Marechal Carmona, entre a Baía de Cascais e a Marina. Ou seja, mesmo no coração de Cascais. O local perfeito para passear e fazer um périplo cultural sabendo que pode começar ou terminar – conforme prefira – com uma deliciosa refeição num restaurante pequeno e acolhedor, que é uma ilha de sossego no meio da agitação – o que não tem em vista, compensa em tranquilidade.
O Artsy fica num antigo palacete do século XIX recuperado – a Casa Trindade Baptista –, ao qual foi anexado um edifício moderno com uma fachada do famoso artista plástico Vhils. Abriu em maio do ano passado, portanto, é caso para dizer que ainda cheira a tinta fresca. E se é verdade que a maior parte das pessoas ainda se sente intimidada por entrar num hotel para ir comer uma refeição ao seu restaurante – aquela terrível sensação que lhe diz que, não sendo hóspede, não tem nada que estar ali e que alguém vai aparecer para lhe dizer isso mesmo –, no Art, esse temor desaparece num instante, cortesia da equipa. Torna-se óbvio, muito rapidamente que a ideia, ali, é fazer amigos, ter clientes habituais, estar inserido no bairro e na vida dos seus habitantes. Pessoas que, quando estão acompanhadas, ficam numa mesa, mas que, quando estão sozinhas, ficam ao balcão, onde têm vista privilegiada para a zona de finalização de pratos. E aqui, podemos garantir que a conversa é sempre divertida.
As paredes cor de areia trazem a praia para dentro de casa, o teto baixo foi disfarçado com a aplicação de espelhos, que tornam o espaço muito mais aberto. Sentamo-nos ao balcão, onde vamos falando com o chef David Casaca – jovem, mas com bastante experiência: Bica do Sapato, Assinatura e Tágide são alguns dos restaurantes por onde passou; fez parte da equipa do Ritz Four Seasons e, mais recentemente, esteve no restaurante Drogaria, também em Lisboa. Primeiro, chega um pão de massa mãe feito em casa com manteiga noisette com pó de cebola. Logo de seguida aparece a estranha bola de Berlim que aqui nos trouxe: pequena, mas deliciosa – é perfeitamente reconhecível aquele sabor característico da massa frita, mas nada de açúcar e em lugar do creme de pasteleiro, temos pedaços de camarão com um molho, talvez com o seu quê de hollandaise, que, junto com o cebolinho, transforma uma ideia inusitada numa realidade harmoniosa. Esta jornalista teria ficado por aqui e comido meia dúzia, mas não lhe deram essa opção. E ainda bem porque, logo de seguida veio um excelente gnocchi com caril verde e grão frito.
O menu de jantar divide-se entre snacks – como a bola de Berlim – e pratos para partilhar – como o gnocchi e outros sobre os quais já falaremos. Ainda assim, as porções são pequenas, pelo que convém sempre pedir mais pratos do que o número de pessoas, mesmo contando com um snack ou dois (ou três!). Para além do menu jantar – que é servido a partir das 19h – há um outro, aquilo a que o restaurante chama de menu de lazy lunch, que, na prática, inclui pequeno-almoço (sim, é possível), brunch e almoço. Para os hóspedes, o pequeno-almoço é servido até às 13h (que maravilha!), quem vem de fora e também quer tomar um pequeno-almoço, pode fazê-lo apenas até às 10h – terá à sua disposição coisas como iogurte de coco, fruta fresca e granola; panqueca, ovo estrelado e bacon; ovo benedict; e ovos mexidos, cogumelos e espinafres. Já o lazy lunch é servido entre as 11h30 e as 14h30 e inclui opções como burrata, beterraba e citrinos; batata rosti, salsicha e tomate cherry; pão de massa mãe, abacate e salmão gravlax; e até pizzas.
Mas voltemos à experiência desta jornalista. Depois do gnocchi, chegou uma raia, inspirada na tradicional raia alhada, mas com salada verde de aneto, hortelã, chicória e amêndoa tostada. Aqui o peixe e o marisco é sempre fresco, apanhado com artes de pesca. "Junto com a bola de Berlim, o peixe do dia é sempre um bestseller", diz o chef enquanto finaliza o próximo prato de peixe. E este com um acompanhamento muito especial: cherne no carvão com xerém e bivalves. Para quem é apreciador desta iguaria típica do sul do país – e que, como muitas outras iguarias da nossa herança gastronómica, começou por ser comida de pobres –, é uma grande surpresa encontrá-la aqui e foi, sem dúvida, um ponto alto desta refeição.
O menu, principalmente o de jantar, com a sua divisão entre snacks e partilhas, pode ser confuso ou pouco esclarecedor. Coisa que se resolve de duas maneiras: pedindo conselhos à equipa, que tem enorme gosto em criar uma relação de proximidade com os comensais, ou – e uma coisa não invalida a outra – optando pelo menu The Art Experience que inclui cinco pratos escolhidos a dedo pelo chef David Casaca.
O almoço terminou com gelado de crème brûlée acompanhado de figos grelhados e figos caramelizados que é, provavelmente, a mistura de sabores mais deliciosamente outonal que se pode fazer. No final de agosto ainda parecia fora de tempo, mas neste quase início de outubro, soa a perfeição numa taça.
Onde? Avenida D. Carlos I nº 246, 2750-310 Cascais Horário? Almoços, todos os dias, das 11h30 às 14h30 |
Jantares, de terça a sábado, das 19h - 22h30 Reservas? Telefone: 21 013 2394 | E-mail: reservations@artsycascais.com
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