Isto Lembra-me Uma História: Um Papa como uma estrela pop
Esta história é diferente das histórias dos antecessores de Francisco. Muito mais do que lembrar as histórias desses, a deste Papa lembra muito mais a de uma lenda do rock, por exemplo. Francisco é o grande ídolo das multidões.
Em semana amplamente dedicada à visita do Papa Francisco a Portugal no âmbito das Jornadas Mundiais da Juventude, houve uma publicação que não demorou a saltar das redes sociais para os sites noticiosos, revestindo-se ela própria de notícia: Catarina Furtado, sempre ativista, sempre consciente, disse uma coisa. Na referida publicação, Catarina Furtado diz aliás muitas coisas, e todas elas com muito acerto - a apresentadora e atriz assume o reflexão sincera e humilde em que pesa prós e contras dos comportamentos e posturas dos crentes, e em que assume ficar sensibilizada com o evento em si, que lhe dá renovada esperança no futuro, e com a presença e os discursos do Papa, em particular. Tudo ali está certo, mas há um acerto que sobressai: a forma airosa como se refere a Francisco: o "Papa star". É a designação perfeita para este homem diante daquela impressionante multidão.
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A Igreja Católica, que em tantos temas, de tantos ângulos e em tantos setores, se mantém conservadora, e que tantas vezes é acusada de ser velha e bafienta, revelou por estes dias a sua faceta mais progressista, jovial e contemporânea numas Jornadas Mundiais da Juventude que dividiram opiniões, mas que geraram unanimidade em torno de pelo menos um elemento: o Papa Francisco. É, sem dúvida, um "Papa star". E é curioso que este senhor já de idade avançada - completa, a 17 de dezembro, 87 anos - seja a face mais jovem e fresca de uma instituição que nem sempre tem sabido reagir e interagir com as novas gerações e as novas necessidades dos tempos que vão mudando.
Francisco - mas não só Francisco, porque o Papa é apenas o vértice mais visível de um polígono que é toda uma estrutura e toda uma organização que parece querer mostrar uma abertura e um espírito que não se lhe reconheciam - é uma estrela pop. Em seu torno, um evento massivo é organizado como se os Queen fossem atuar em Wembley, como se os Guns n’ Roses fossem encerrar Glastonbury, ou como se a Taylor Swift fosse atravessar a cidade de Lisboa num jipe branco descapotável.
O tom com que o escrevo pode sugerir uma certa ironia, mas não é essa a ideia. Acredito que devemos encarar com boa disposição e algum otimismo o facto de haver um Papa que não se leva demasiado a sério no que não é para ser levado demasiado a sério. E Francisco é um homem muito sério quando o assunto assim o exige. Aliás, os seus discursos ao longo destas JMJ pautaram-se pelo espírito crítico, franco e assertivo com que encarou o grande escândalo da Igreja nos séculos XX e XXI - os abusos sexuais de crianças, obviamente -, e fê-lo sem rodeios nem eufemismos, mas também sem pudores nem extravagantes sentimentos de culpa: os responsáveis devem ser culpados e punidos, e tragédias desta dimensão não devem nunca repetir-se. Mas Francisco soube equilibrar, com notável sensibilidade, essas mensagens - obrigatórias, diga-se - com uma ligeireza nobre e fresca noutras passagens das missivas que dirigiu aos fiéis.
É que o Papa Francisco tem uma indubitável star coolness. Talvez seja por ser argentino, talvez seja por ser uma extraordinária pessoa, talvez seja porque se cultivou no Cristianismo olhando mais para o lado esperançoso e feliz da fé do que para a sua face mais escurecida, amarga e triste. A verdade é que o Papa Francisco tem um carisma de uma pop star, capaz de encher estádios, sim - e é normal, porque é o Papa -, mas Francisco acrescenta a essa natural atenção que lhe dedicam um inesperado magnetismo que faz com que as multidões não o sigam apenas para o ver, mas que o façam também, e sobretudo, para o ouvir com atenção. Todos querem estar na primeira fila, como sucede com qualquer ídolo pop, mas Francisco é muito mais do que um pano de fundo para uma selfie no Instagram ou um vídeo no Tik Tok: ele é mesmo uma inspiração e as suas palavras soam aos fiéis como mantras, como refrões de hit singles que a audiência repete com fervor e emoção. Foram vários os exemplos ao longo das Jornadas, mas há uma passagem especialmente memorável em que Francisco, qual líder de uma banda de hard rock, depois de pedir aos fiéis que lhe respondessem a uma pergunta - e depois de os fiéis responderem timidamente -, disse ao microfone "como? Não estou a ouvir. Mais alto!", e o público novamente respondeu, desta vez mais alto, e Francisco, não satisfeito, insistiu "mais uma vez, que eu não ouvi bem!", e então a multidão respondeu com garra.
É esta capacidade de interação, de entertainer, que o Papa Francisco tem que o distingue dos seus antecessores e o tornam notável dentro da própria instituição que representa. A solenidade não tem de ser sorumbática e a fé nunca teve de ser séria como um polícia de trânsito: para Francisco e para os fiéis que o seguem, a fé é uma coisa boa e bem-disposta que existe na vida e no mundo, e ainda bem. Francisco não tem receio do excesso de luzes e de fogo de artifício. Pelo contrário, parece divertir-se imensamente com esses artefactos que o deslumbram simplesmente porque existem, tal com se deslumbra e diverte com estes milhares e milhares e milhares de jovens peregrinos que cantam e riem em torno de uma ideia que, em toda a extensão da sua ingenuidade, é bonita e merece apreço: a mensagem de Jesus Cristo ainda pode salvar.
O Papa Francisco até pode saber que essa crença é utópica. Mas, como em tudo quanto é humano neste mundo, ele também sabe que uma boa ideia é melhor que ideia nenhuma e que acreditar em ídolos bons é muito melhor do que seguir maus exemplos. É por isso que é de saudar que Francisco encarne com satisfação e convicção a personagem de "Papa star" e assim consiga manter coesa e inspirada uma juventude que, muitas vezes, precisa mesmo de uma referência pop que a oriente. E quem melhor para referência do que o próprio Papa? Viva o Papa e viva a pop!
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