LAB by Sergi Arola: quem provou, provavelmente nunca esquece
O LAB de Arola, no Penha Longa, tem uma nova carta que percorre o país gastronómico. De norte a sul, a volta a Portugal mais saborosa que já provámos.
Foi há quase 20 anos que Sergi Arola aterrou em Lisboa para abrir o Arola, no Penha Longa. Ainda hoje somos recebidos com uma fotografia tirada nessa altura, o chef duas décadas mais novo, posando ao lado de um velho camião, na Praça da Ribeira, rodeado por caixotes. "Foi antes das obras", recorda-se. "Não sou só eu quem está diferente, nessa altura a Ribeira ainda nem era um mercado, mas uma praça", explica com a nostalgia própria de um catalão apaixonado por este país.
Quando chegou era já uma estrela em Espanha, com um percurso cimentado nas cozinhas de Ferran Adrià e Pierre Gagnaire, antes de se lançar a solo e conquistar o reconhecimento do guia mais famoso do mundo. As tatuagens, a atitude rock’n’roll e o estilo bad boy ajudaram a cimentar essa fama, mas quem tivesse entrado numa das suas cozinhas percebia rapidamente o contraste entre esse look e a atmosfera calma e tranquila que reinava – nos antípodas das cozinhas de gritos.
Ainda hoje, no Penha Longa, mesmo depois de terem acrescentado o mais ambicioso LAB ao Arola, o registo é o mesmo, porque esta cultura foi muito bem passada ao chef executivo, Vladimir Veiga, que faz as vezes de Sergi quando está em Espanha ou no Chile, onde passa mais tempo agora.
Os dois mostram uma enorme cumplicidade e um método de trabalho único. Quando Arola pretende criar um novo prato, desenha-o num caderno, já empratado e com os ingredientes discriminados, e envia esse desenho para que Vladimir o prepare. "É assim que nascem os pratos do LAB.
"Não as posso tirar da carta, se não matavam-me"
Quem já provou uma das suas Molejas dificilmente se esqueceu do prato. Essa parte do vitelo "que é melhor nem perguntar de onde vem" tem um sabor inacreditável nas suas mãos, e por isso mesmo, com variações e declinações, nunca saem da carta. São a sua assinatura, e desta vez surgem acompanhadas por um molho Vindaloo, que é indiano, como todos sabemos, mas muito português também, porque tem por base a nossa vinha-d’alhos.
Quando o chef brinca que não pode tirar as molejas da carta "se não matavam-me", apercebemo-nos que não se refere apenas aos portugueses que regressam, mas a muitos estrangeiros que voltam ao país, ao hotel e aos pratos que lhes ficaram na memória. "São as Molejas e a carne Mirandesa. Impossível", e neste novo menu, ainda a vamos provar de duas formas, primeiro num fumeiro e depois acompanhada por um arroz de cabidela e tempura de foie-gras… mas talvez seja melhor não nos perdemos, porque o jantar tem os seus momentos, e melhor será começar pelo princípio…
Um jantar, duas experiências
Entrando no Pavilhão de Golfe do Penha Longa, onde ficam localizados os dois restaurantes de Sergi Arola, descobrimos a velha foto na Praça da Ribeira e podemos optar entre o Arola, de cozinha mais descontraída e um conceito de tapas mediterrânicas, ou o LAB, de fine dining. Foi o nosso caso, e por isso somos conduzidos por uma escadaria em caracol até ao piso superior. Na realidade o restaurante fica no piso térreo, mas a experiência começa aqui em cima, numa grande sala com janela aberta para o verde da várzea de Sintra e uma pequena cozinha onde é possível acompanhar o trabalho dos mestres. Será um momento mais informal, e intimista, sem barreiras, próprio até para trocar impressões ou fazer perguntas. Muito inspirado numa lógica de tapeo, típico da gastronomia espanhola, mas com um cunho totalmente nacional. Aliás, a grande mesa tem um mapa de Portugal gravado a todo o comprimento, onde as tapas vão sendo colocadas segundo a origem. "Nós sabemos de onde vêm a sandes de leitão ou a carne mirandesa, mas os turistas que nos visitam não sabem", explica o chef Vladimir, com Arola a acrescentar, ao som de um fado: "queremos ter esse papel de embaixadores da gastronomia portuguesa".
E assim começamos a nossa experiência, de sul para norte, com um "fóssil de caldeirada", um pequeno pastel que precisa de ser "desenterrado" e que revela todo o sabor de uma caldeirada de gambas. Seguimos para umas "migas de espargos e enchidos", uma "sandes de leitão" onde a pele crocante faz de pão e a "carne Mirandesa em fumeiro", finalizando ainda com um pequeno salto aos Açores, para um "tártaro de ananás e cavaco", numa experiência fumegante que faz lembrar as furnas.
Novidade na carta, estas pequenas entradas revelam uma criatividade, originalidade, e sabores que não nos importávamos de repetir já de seguida, se não soubéssemos que estamos apenas no início e que ainda há muito para provar lá em baixo…
No restaurante esperam-nos três menus: a Horta do Chef, vegetariano, Pela Serra Dentro, com maior ligação à serra de Sintra, e Pela Serra Fora, que nos leva numa viagem um pouco mais longa em distância e número de pratos. Os preços variam entre os 154 e os 186 euros, sem acompanhamento de vinho – mas quem o escolher terá uma surpresa, porque há muita sabedoria e originalidade também do lado dos sommeliers. De qualquer forma, a cave guarda mais de 550 vinhos, pelo que não faltarão opções à carta.
Os três menus não repetem um prato, e será no Pela Serra Fora, que podemos experimentar as Molejas com vindaloo, assim como um Robalo do mar, prato totalmente novo, acompanhado por alho francês, uma nage de chalota e Chablis, decorado como se fosse um pano típico de Cabo Verde. Lindo. O Serra Dentro guarda, por sua vez, a exclusividade de um Carabineiro muito fresco, com baunilha de São Tomé, beterraba e laranja. Outro clássico revisitado, com a adição da cabeça do carabineiro com uma salada de funcho no interior. E a famosa carne Mirandesa, que agora surge com uma guarnição de arroz de cabidela e uma tempura de Foie Gras a acompanhar.
Para além das tapas nacionais, comuns a todos, o Serra Dentro oferece quatro pratos, sendo um deles sobremesa (tal como o Horta do Chef), e o Pela Serra Fora seis pratos, com duas sobremesas. Neste caso temos também uma estreia e outra revisitada. A estreia será a Framboesa com yuzo, iogurte e algodão doce. A repetente a Sardinha Viajante, mas que, com café, chocolate, queijo de cabra, cardamomo e caramelo salgado, está tão diferente que quase parece totalmente nova. Acima de tudo, são ambas propostas "estupidamente" boas.
O certo é que cerca de 90% da carta acaba por ser completamente nova, e mesmo aos clássicos de sempre foram-lhes acrescentadas novas camadas e sabores. O LAB é, definitivamente, um grande laboratório de ideias gastronómicas e leva-nos agora numa viagem pelos sabores únicos de Portugal, com um toque naturalmente ibérico, mas também já uns retoques crioulos pela mão de Vladimir. A estrela Michelin que conserva há mais de oito anos começa a parecer curta.
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