Uma seleção toda empoderada
O tempo das calculadoras já lá vai. Quem viu Portugal jogar as fases de apuramento para Mundiais e Europeus nos anos 90, sabe bem do que se trata: faltava sempre um golo, havia sempre um azar, calhava sempre mal um sorteio, um malandro de um árbitro. Hoje não é assim: Portugal tem, talvez, a mais poderosa seleção da Europa.
O pragmatismo até pode ser bonito, mas a maior beleza de um ato pragmático é este não requerer nem depender de qualquer tipo de cuidado estético. Se é para fazer, faz-se e fica pronto. Vem isto a propósito do apuramento da Seleção Nacional de futebol para o Euro 2024, conseguido como se tivesse havido recurso a propulsores laterais, atingindo uma velocidade estonteante e exibindo uma potência colossal. Em sete jogos, Portugal obteve sete vitórias e marcou um número impressionante de golos, 27 (dá uma média de quase, quase 4 golos marcados por jogo), tendo sofrido apenas dois, e ambos no último jogo que fez, diante da Eslováquia (vitória por 3-2), a seleção que ocupa o 2.º lugar do grupo J e que é aquela que exibe números menos distantes dos que os portugueses ostentam - ainda que a distância entre os dois registos seja abissal: os eslovacos marcaram 10 golos e sofreram 5.
Haverá mais do que uma explicação para o brilhante desempenho dos portugueses nesta fase de grupos - uma fase de grupos em que o registo mais próximo, ainda que remotamente, é o da França, vice-campeã do Mundo em 2022, que lidera o grupo B com seis vitórias em outros tantos jogos e exibe um registo de 13 golos marcados e somente um sofrido. Mesmo assim, é preciso simpatia para considerar o desempenho dos franceses próximo da espetacularidade do dos portugueses. Espanha, no grupo A, parece ter uma produtividade mais adequada a comparar-se com a portuguesa - 19:3 em golos marcados e sofridos -, porém regista uma derrota em seis jogos, o que a obriga a partilhar a liderança do grupo com a improvável Escócia.
Uma explicação muito aceitável para a extraordinária figura que a Seleção Nacional tem vindo a fazer até ao momento passa, naturalmente, pela composição do próprio grupo de apuramento. Sendo a portuguesa uma seleção de topo mundial na atualidade, não seria de esperar que viesse a encontrar grandes dificuldades quando os adversários que tem pela frente são Eslováquia, Luxemburgo, Bósnia-Herzegovina, Islândia e Liechtenstein. Olhando para o alinhamento, podia perfeitamente tratar-se do elenco para um torneio particular e amistoso, cuja função fosse dar ritmo aos craques portugueses de modo a que, quando chegasse o Europeu propriamente dito, a equipa estivesse rotinada e em forma para defrontar oponentes dignos desse nome.
No entanto, pensar assim seria não só injusto para equipas que apresentam um futebol competitivo (Eslováquia), como também maldoso relativamente a seleções emergentes, cuja qualidade de jogo muito tem progredido nos últimos tempos e que se elevam claramente acima das seleções mais fracas, como é o caso do Luxemburgo, que segue num muito digno 3.º lugar, ainda a disputar o apuramento com a Eslováquia, e cuja defesa tem deixado excelentes indicadores - pelo menos, se ignorarmos os jogos contra Portugal, no decorrer dos quais sofreu nada menos que 15 golos; nos restantes 5 jogos, contudo, concedeu apenas dois.
Além da qualidade destas duas equipas - uma qualidade que Portugal soube muito bem contornar e derrotar -, convém lembrar que nos demais grupos existem surpresas vindas precisamente daquelas seleções que tendemos a considerar underdogs. No grupo I, a favorita Suíça segue em 2.º, atrás da frágil Roménia; no grupo H, a Eslovénia lidera à frente da Dinamarca, que à partida seria mais forte; a Sérvia é segunda - e com apenas 3 vitórias em 6 jogos - num grupo G liderado pela Hungria, que há já muitas décadas não consegue apresentar uma equipa competitiva; o grupo E é um escândalo: a Albânia é primeira, a República Checa é segunda e a Polónia surge apenas em terceiro (e, pelo caminho, ao longo do apuramento, já despediu Fernando Santos, o ex-selecionador de Portugal). Ou seja, os favoritismos à partida têm sido contrariados em diferentes grupos. Se Portugal tem cumprido com a expectativa e ainda o tem feito com brilhantismo, então não se deve procurar as supostas fragilidades alheias: antes se deve valorizar os méritos próprios. E um dos méritos próprios será, sem dúvida, Roberto Martínez, o gentil espanhol que veio ser selecionador de Portugal e que parece entender as dinâmicas deste superlativo grupo de jogadores muito melhor do que a esmagadora maioria dos portugueses - treinadores de futebol incluídos.
Ao ver Portugal garantir o apuramento para o Europeu logo à 7.ª de 10 jornadas, com um pleno de vitórias e uma generosa vantagem no confronto entre golos marcados e golos sofridos, lembro-me dos tempos em que, para conseguirmos apurar-nos para uma fase final de uma grande competição internacional, tínhamos de esperar pelo último segundo, do último minuto, da última jornada, sempre fazendo contas e procurando a combinação ideal de golos que se marcam aqui e são sofridos acolá, entre probabilidades, improbabilidades e impossibilidades. São tempos que, felizmente, já lá vão. Mas quem tem idade para isso, certamente ainda se lembra da desilusão de 1998, quando a grande seleção portuguesa da chamada geração de ouro (João Pinto, Rui Costa e Figo, Paulo Sousa, Vítor Baía, Jorge Costa e Fernando Couto - podíamos continuar, era um autêntico desfilar de estrelas oriundas sobretudo dos sucessos das seleções sub-20 e sub-21 nos mundiais em Riade, em 1989, e em Lisboa, em 1991) colapsou num grupo ganho pela Alemanha, com a Ucrânia a apanhar o segundo lugar por apenas 1 ponto: Portugal somou 19, enquanto os ucranianos fizeram 20. Essa foi a última vez que Portugal não se qualificou para uma fase final de uma grande competição. E desde então participou em todos os Europeus (terminando em 2.º em 2004 e sangrando-se campeão da Europa em 2016) e em todos os Mundiais (com um 4.º lugar em 2006).
O pragmatismo desta equipa portuguesa é, de facto, admirável. A maneira simples e eficaz como conseguiu o apuramento é digna de elogios, até talvez de estudo - o que teremos feito tão bem de maneira a que isto tenha ficado tão bem feito? -, mas o que mais me merece encómios e até espanto é a qualidade do jogo dos portugueses em muitos, muitos momentos desta fase de apuramento. Se alguns jogos não foram muito bem conseguidos e valeram mais pelo resultado do que pela exibição, como aconteceu na Islândia e na Eslováquia, houve outros jogos em que uma pontinha de sorte em alguns momentos podia ter feito muita diferença.
O jogo de sexta-feira contra a Eslováquia, no Estádio do Dragão, é um desses exemplos. Com um placard final de 3-2 para Portugal, os mais desatentos podem enganar-se pensando que se tratou de uma partida equilibrada. Não podiam estar mais longe da verdade: este foi um jogo praticamente de sentido único que a Seleção Nacional podia - e devia - ter resolvido logo na primeira parte, quando Cristiano Ronaldo e Gonçalo Ramos foram demasiado piedosos na hora de fazer golo ao adversário, ou então na parte final do jogo, quando Diogo Jota teve pelo menos três oportunidades flagrantes de ampliar a vantagem no marcador. Contas feitas, não seria de espantar se tivéssemos conseguido mais 4, 5 ou até 6 golos - não é exagero, Portugal podia mesmo ter marcado muitos, muitos mais.
Há momentos em que parece faltar qualquer coisa para que tudo corra imensamente bem. Há de ser certamente coincidência que esses momentos ocorram quase sempre quando Cristiano Ronaldo está em campo. Não querendo aqui estabelecer uma relação de causa-efeito entre a presença do capitão e a falta de sorte ou de acerto da equipa na hora H, fica o desejo de que Roberto Martínez tenha a habilidade e o bom senso de gerir as coincidências, a sorte e a falta dela nos momentos certos.
Conseguido o apuramento, resta esperar que esta incrível seleção (no jogo contra a Eslováquia, o selecionador chamou do banco João Félix, Diogo Jota, Otávio e Ruben Neves, só para termos uma ideia da qualidade que esta equipa exibe e até esbanja) mostre no Europeu ao que vem e onde pode chegar. Olhando daqui, não há na Europa nenhuma equipa ao nível da portuguesa. Que o demonstrem em campo e que tragam para casa o troféu. Qualidade - e qualidade em quantidade! - para o fazer não falta.
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