Quatro vinhos e as suas histórias: Brancos que espelham o Douro, um palhete de Lisboa e um açoriano do Pico
Tradicionalmente o mês de todas as vindimas, setembro marca o culminar de um trabalho que começa logo após a “lavagem dos cestos”. Além da família e dos amigos, é neste período que surgem algumas equipas sazonais para ajudar à festa.
Vinha do Borrajo Branco 2022
O produtor e enólogo Paulo Coutinho plantou a vinha em 2016 em terrenos pertencentes à família onde está um pequeno casebre que é reproduzido no rótulo deste vinho. O responsável prefere não o diferenciar do vinho tinto, nem da forma como são tradicionalmente produzidos, uma vez que o produz como se fosse um tinto.
Paulo Coutinho quer minimizar as intervenções durante a fermentação e evitar adições externas, pelo que o fermenta com a película e faz a maceração. Reconhece que a principal dificuldade, especialmente ao usar leveduras indígenas, "é a facilidade com que ocorre a fermentação malolática, o que pode reduzir a acidez natural do vinho. O branco é feito com as três castas existentes na Vinha do Borrajo: Viosinho, Gouveio e Encruzado, esta última por ser uma das que mais admira "pela sua longevidade" e que julga "ser um belo complemento às duas durienses".
O produtor sugere o consumo um pouco acima da temperatura normal de brancos, acima dos 10ºC. e, por considerar que o vinho é "bastante gastronómico", tem a convicção que "surpreenderá durante uma refeição, seja com peixe, seja com carne".
O preço recomendado de 33 euros é justificado, não pela quantidade produzida, "mas sim pelo investimento em vinha e que é o dobro de custo por hectare no Douro". Paulo refere que o branco se pode harmonizar "de imediato com a nossa gastronomia da costa", mas acrescenta que "terá um belo envelhecimento em garrafa para depois casar muito bem com algo que normalmente está associado a vinhos tintos".
O produtor e enólogo salienta que o Vinha do Borrajo não é um branco típico por "evidenciar aromas mais láticos". O responsável garante que o vinho é destinado "aos consumidores que procuram um branco sério, sem serem atacados com notas de madeira". Paulo Coutinho conclui que "a alta altitude desta vinha faz-se notar na acidez e mineralidade" num branco do limite da região duriense, "a tocar a serra de Miguel Torga, a serra da Senhora da Azinheira".
Monumental Tarelo Branco 2018
O consultor Cláudio Martins sublinha que este branco "é um exemplo do renascimento da viticultura nos Açores". Refere que a região, historicamente reconhecida por seus vinhos, "viu um declínio na produção, há algumas décadas, mas os esforços recentes de produtores resilientes e enólogos aventureiros, têm revitalizado a tradição".
Com uma produção de apenas 1000 garrafas, o responsável explica que a produção do Tarelo – expressão açoriana que significa juízo – "envolve técnicas tradicionais, com colheita manual e fermentação em cubas de inox", sendo que a maior dificuldade na produção "é a adaptação ao clima insular, que pode ser imprevisível, e as características do solo vulcânico que exigem cuidados especiais na viticultura".
O consultor aponta a escolha da casta Arinto dos Açores pela "sua adaptabilidade ao terroir açoriano e pelas suas características únicas que proporcionam frescura e mineralidade ao vinho". Além disso, acrescenta, "a variedade é conhecida por sua acidez equilibrada e salinidade".
Cláudio Martins recomenda entre 8°C. e 10°C. para o servir, mas "pode ser apreciado sozinho, ou combinar muito bem com pratos de peixe grelhado, mariscos ou saladas frescas". Um exemplo, refere, "seria um ceviche de peixe branco, que complementa a acidez do vinho".
O consultor refere que o preço que ronda os 80 euros do Monumental Tarelo foi determinado pela sua "exclusividade e qualidade, refletindo o trabalho artesanal e a produção limitada". Cláudio Martins garante que "poderá ser consumido de imediato, até porque já tem alguns anos em garrafa, embora tenha um enorme potencial para ser guardado e consumido daqui a 15 ou 20 anos". Refere que este vinho "foi produzido com a intenção de resgatar a tradição vitivinícola da região e atrair apreciadores que valorizam vinhos de terroir e produção limitada". O responsável conclui que o território dos Açores, com seu solo vulcânico e clima marítimo, "influencia significativamente o perfil do vinho, conferindo-lhe uma mineralidade distinta e frescor, que são características marcantes dos vinhos da região".
Adega Mãe Palhete
Este palhete, que mistura castas tintas e brancas, surge, para o enólogo Diogo Lopes, "em linha com a tendência de recuperação de um perfil tradicional, também na região de Lisboa, que faz regressar tintos de menor graduação, com grande frescura e elegância".
O responsável explica que o vinho se destaca pela co-fermentação conjunta das castas durante cinco dias, "seguida de prensagem e final de fermentação em cubas de inox". O perfil do vinho, acrescenta, "é muito definido pelo tempo de colheita, assegurando a níveis de acidez e baixo volume pretendidos". O palhete é feito de Castelão, Pinot Noir e Fernão Pires que o enólogo justifica pelo "carácter de grande elegância das tintas e pela identidade e carga aromática do branco que é Fernão Pires".
Sugere-se que o vinho se sirva a 14ºC. ou 15ºC. e, segundo o responsável, "tem uma grande versatilidade para um brinde ou para a mesa, sobretudo para aperitivos, ou mesmo peixes ou carnes pouco condimentados". O preço de cerca de nove euros é fundamentado pelo enólogo como "um vinho especial, com um processo particular, mas com a casa a procurar ao máximo democratizar a sua experiência de provas". Diogo Lopes diz que "é um vinho para beber no imediato, mas será muito curioso observar a sua evolução ao fim de alguns anos, porque tem uma frescura e acidez que lhe asseguram potencial para isso".
O palhete, em linha com alguns tintos que a Adega Mãe lançou, como o Tinto Atlântico, é apontado como "uma forte tendência no mercado de procura de vinhos com este perfil de frescura e elegância, que permitam experiências de consumo, sobretudo no tempo mais quente, que os vinhos de perfil mais clássico não permitem".
Por último, o enólogo refere que a região de Lisboa, graças ao terroir de influência atlântica, "tem um potencial extraordinário para a produção de vinhos com este perfil, como aliás no passado".
Pessegueiro Reserva Branco 2023
O enólogo João Nicolau de Almeida explica que o branco foi produzido desde 2020, o que mostra quatro anos de história "que representam as parcelas de vinha e comprovam a sua essência, mantendo sempre o seu perfil". O responsável aponta as vinhas localizadas em diferentes altitudes, "desde 150 a 350m, viradas a Norte em Ervedosa do Douro, terroir do Cima Corgo". Refere que "as uvas são transportadas em caixas de 22 Kg até à adega e ficam 12 horas em câmara frigorífica, parcialmente esmagadas e prensadas em prensa vertical, com leve maceração pré-fermentativa". Conclui que "a fermentação natural com leveduras indígenas ocorre na totalidade do lote em pipos usados de 600 litros antes de estagiar seis meses em madeira sobre borras finas".
Elaborado com as castas Rabigato e Folgazão, Nicolau de Almeida garante que a primeira "transmite frescura e precisão, enquanto a segunda "imprime untuosidade".O enólogo refere que a temperatura ideal para o servir é entre 10 a 12 graus, sendo que "acompanha bem todo o tipo de pratos de peixe e pratos de carnes grelhadas, além de ser muito bom sozinho".
Com um preço de 18 euros, o branco pode ser apreciado neste momento, mas, segundo o responsável, "tem um excelente potencial de guarda". Acrescenta que a ideia é procurar "consumidores que procuram vinhos com identidade própria e caracterizados pela elegância, frescura, acidez e harmonia".
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Maio, ou na versão endeusada dos romanos, Maya, é geralmente um mês de muito trabalho na vinha. Aqui segue-se a rota do românico no Alentejo, ouve-se um grito de liberdade no Douro e percebe-se a cor rosada de dois durienses.
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