Pêra Manca 2018: chegou a nova edição de um vinho mais que raro
O dia 9 de outubro fica registado no calendário dos enófilos: foi nesse dia que as garrafas de Pêra Manca 2018 viram a luz do dia depois de anos na escuridão. Esta é apenas a 17.ª edição do vinho mais exclusivo da Fundação Eugénio de Almeida.
Chega-se ao pátio que precede a entrada na adega da Cartuxa e a gravidade do sítio pressente-se nos elementos que se apresentam diante dos olhos. A arquitetura, a imensidão das vinhas, a dimensão monumental do edifício da adega, tudo. Até a árvore, uma árvore muito grande, que se exibe em pleno pátio com aquela passividade das coisas que são muito antigas e para quem o sossego é um modo de estar na vida. Que árvore será esta? Leigo da flora, não a sei identificar. Frondosa e seguramente velha, talvez sirva para nos alertar que estamos prestes a entrar num mundo onde o tempo e outros mistérios são essenciais para que se chegue ao que nos traz aqui, e que nem sempre o ser humano, finito e miudinho, tem de saber tudo sobre todas as coisas.
Pêra Manca
O que nos traz aqui é o Pêra Manca. O vinho mais especial, exclusivo e raro da Cartuxa, da Fundação Eugénio de Almeida, vê as garrafas da colheita de 2018 chegarem ao mundo exterior, depois de terem passado quatro anos na penumbra das caves da Quinta de Valbom. É um edifício formidável, mandado erigir no século XVI, como Casa de Repouso dos Jesuítas. Demorou 10 anos a construir e era composto por múltiplos alojamentos, refeitório e capela. Muitos desses espaços têm hoje propósitos diferentes, mas talvez não tanto quanto se possa pensar. Onde dantes repousavam frades professores, descansam hoje lotes de vinho, em garrafas, em pipas ou em tonéis. Aliás, logo no corredor principal, o visitante é presenteado com a visão imponente de tonéis de 5 mil e de 3 mil litros, dispostos intercaladamente. "É aqui que repousa o próximo Pêra Manca", explicam-nos. E sente-se ainda mais a tal gravidade do sítio.
O Pêra Manca não é produzido em todas as colheitas. As uvas que lhe dão origem só resultam neste vinho se a colheita for, de facto, excecional. E mesmo depois de aferir da excecionalidade dessas uvas, só mesmo as melhores de entre as melhores parcelas estarão aptas a integrar os lotes que darão origem a este vinho raro. Não, raro não: único. Mesmo entre as diferentes colheitas de Pêra Manca as variações são percetíveis. Nunca é feito da mesma maneira. Nunca segue a mesma receita. Só a sua origem é imutável, assim como o critério de exigência que o certifica e lhe permite o rótulo.
É obtido a partir das castas Aragonez e Trincadeira. Embora nenhuma das castas se sobreponha definitivamente à outra, cada ano de produção requer um equilíbrio específico entre as duas: às vezes, 55% da primeira e 45% da segunda; noutros anos, o contrário. Noutros ainda, 50/50. As proporções são sempre equilibradas, mas nunca exatamente iguais de ano para ano.
Outro dado que bem atesta o caráter único do Pêra Manca é a variação no número de garrafas produzidas. A colheita anterior, a de 2015, atingiu as 44 mil garrafas - e não foi a maior de todas. A que agora se lança, de 2018, ronda as 21 mil. Mas já houve outras de 14 mil e 15 mil. A variação tem que ver com a quantidade de uva de qualidade excecional produzida em cada ano nas parcelas eleitas.
A origem
O nome de Pêra Manca tem uma origem ancestral e a sua história compõe-se e reveste-se de lenda. São assim mesmo as grandes histórias. Diz a tradição que Pêra Manca é uma derivação de "pedra manca". E as pedras mancas eram pedras oscilantes, formações graníticas que resultavam em seixos arredondados que assentavam, em desequilíbrio, sobre rocha firme - oscilando, mancando.
E era desses solos de "pedras mancas" que resultavam vinhos altamente prestigiados da região de Évora. Tão prestigiado que terá sido, uma vez mais segundo a lenda, o vinho que Pedro Álvares Cabral levava consigo na expedição às Terras de Vera Cruz, mais tarde Brasil. Foi o vinho das pedras mancas que Álvares Cabral partilhou com os habitantes locais originais, segundo a descrição de Pêro Vaz de Caminha nas suas cartas ao rei.
O nome evoluiu, assim como o vinho, a Cartuxa e tudo o resto. O vinho seria recuperado e tornado sofisticado já no século XIX, mas a crise da filoxera acabou por lhe interromper a produção. Essa produção, à época nas mãos da Casa Soares, deixou sementes para o futuro. Em 1987, José António de Oliveira Soares, herdeiro da Casa com o seu apelido, decidiu doar o nome Pêra Manca à Fundação Eugénio de Almeida, que passou a utilizar como rótulo a adaptação de um cartaz publicitário desenhado pelo artista Roque Gameiro no século XVIII (o rótulo atual é uma variação simplificada do rótulo original). E, assim, em 1990 nascia a primeira edição do hoje mundialmente famoso Pêra Manca. Desde então, houve 17 edições (em 34 anos), das quais esta, a de 2018, é a mais recente.
O presente
As 21 mil garrafas de Pêra Manca têm como destino principal o mercado nacional, ao qual caberá uma fatia de 50% da produção. Segue-se, em quantidade, o mercado brasileiro, onde a marca se implantou muito bem e vem crescendo de ano para ano. Ao Brasil cabe uma parcela de 6% da produção. Depois vêm mercados como os EUA, Reino Unido, União Europeia, Ásia (Extremo-Oriente, principalmente China) e Austrália.
O Pêra Manca 2018 chega ao mercado com um acréscimo no custo, logo à saída, de €75, elevando assim o preço da garrafa para os €350 (P.V.P. recomendado e na loja da Cartuxa). Este aumento justifica-se com uma subida geral nos custos de produção e ainda com um investimento reforçado na qualidade da própria garrafa, que agora, com mais vidro, pesa 900 gramas.
Além de alguns restaurantes selecionados e garrafeiras de prestígio, o Pêra Manca pode ser encontrado na própria loja da Cartuxa. Porém, adquirir Pêra Manca não se limita a chegar ao balcão, pedir e pagar. Antes disso, o pretendente terá de fazer a visita à Quinta de Valbom e só no fim estará autorizado a comprar uma - e só uma - garrafa de Pêra Manca tinto 2018. Juntamente com uma robusta embalagem de madeira onde pode encontrar a lenda das "pedras mancas" e do vinho de Álvares Cabral, o adquirente leva uma garrafa selada com número de série e registo rastreável, certificando assim, de modo inviolável, a origem da garrafa.
Depois, o ideal é guardar a garrafa em sítio protegido e em condições ideais de humidade e luminosidade. E esperar. Esperar alguns anos para que o Pêra Manca 2018 desenvolva, enquanto repousa, todo o seu potencial e atinja, no momento da abertura, o seu ponto ideal - que é sempre aquele em que temos um bom motivo para abrir uma garrafa destas.
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