Entrevista

Laurent LeCamp, da Montblanc. "Corri na Antártida com os nossos relógios e fiquei em sétimo lugar. Sei do que falo"

Apanhámos o diretor de relojoaria da Montblanc em Genebra para discutir algumas das suas novas ideias, incluindo um relógio de mergulho para usar nas condições mais extremas e um modelo com a difícil tarefa de celebrar os 100 anos da Meisterstück, a famosa caneta de luxo.

Laurent LeCamp
Laurent LeCamp Foto: DR
19 de julho de 2024 | Bruno Lobo

Após assumir a liderança da divisão de relojoaria da Montblanc, em 2021, Laurent LeCamp não perdeu muito tempo até apresentar o primeiro relógio de mergulho da marca. Até então, compreensivelmente, o passado e a ligação à montanha tinham-na afastado desse segmento, mas Laurent discordava e parece que o público concordava com ele, uma vez que se tornou imediatamente no best-seller. Embalado pelo sucesso, Laurent lançou outras ideias, a começar pelo Oxigénio 0, uma "invenção" que retira todo o oxigénio de dentro do mecanismo e isso "faz toda a diferença em ambientes extremos", explica. 

Montblanc Iced Sea 0 Oxygen Deep 4810
Montblanc Iced Sea 0 Oxygen Deep 4810 Foto: DR

Estas duas ideias culminaram este ano na introdução do Montblanc Iced Sea 0 Oxygen Deep 4810. Um dos relógios de mergulho mais bonitos que temos visto, com um mostrador "glaciar" em azul profundo e a panorâmica em 3D de um iceberg visto do lado do mergulhador, no verso da caixa. Trata-se de um modelo capaz de sobreviver às condições mais extremas e a 4810 metros de profundidade. O número é evidentemente simbólico e representa a altura do Monte Branco. Sendo mais provável que consiga chegar aos 5000 metros, mas com um toque poético. Com calibre próprio, certificado COSC e reserva de marcha de 120 horas (cinco dias!), trata-se de um relógio muito sério, numa caixa de apenas 43 mm, em titânio, muito leve e mais pequena do que os modelos semelhantes de outras marcas. "Tentamos competir fazendo melhor do que a concorrência, pelo mesmo preço ou mais barato", acrescenta. 

Montblanc Iced Sea 0 Oxygen Deep 4810: Trata-se de um modelo capaz de sobreviver às condições mais extremas e a 4810 metros de profundidade.
Montblanc Iced Sea 0 Oxygen Deep 4810: Trata-se de um modelo capaz de sobreviver às condições mais extremas e a 4810 metros de profundidade. Foto: DR

Mas na Montblanc não se pode propriamente falar de uma manufatura, uma vez que à sede, em Le Locle, temos de somar a Minerva, em Villeret, que tem um longo passado, sobretudo ligado à criação de cronógrafos, que remonta a 1858. Atualmente, a Minerva funciona como uma pequena divisão de luxo, com sete relojoeiros e virada para peças muito exclusivas herdeiras desse legado. "Se visitarem a Minerva, podem conhecer o vosso relojoeiro", conta, informando que cada relógio é montado do início ao fim pela mesma pessoa. As coisas não parecem estar a correr mal: "Ontem à noite organizámos um encontro com alguns dos maiores colecionadores do mundo, reunidos aqui em Genebra. Convidámos 31 e tivemos 31 encomendas. 100% de sucesso!", congratula-se. Desde o ano passado que vendem mais relógios do que aqueles que conseguem produzir, e o número de encomendas privadas não para de aumentar. 

Minerva Monopusher Chronograph: Um modelo escultural, com várias aberturas laterais para revelar a arquitetura do movimento em todas as suas facetas. O próprio calibre foi invertido para mostrar o funcionamento do cronógrafo do lado do mostrador. Edição limitada a 100 unidades.
Minerva Monopusher Chronograph: Um modelo escultural, com várias aberturas laterais para revelar a arquitetura do movimento em todas as suas facetas. O próprio calibre foi invertido para mostrar o funcionamento do cronógrafo do lado do mostrador. Edição limitada a 100 unidades. Foto: DR

A Minerva funciona também como uma espécie de mentora para muitos dos modelos com a assinatura Montblanc, algo especialmente evidente no caso da coleção Nicolas Riussec, o relojoeiro do século XIX considerado um dos inventores do "cronógrafo". A edição deste ano é particularmente especial, uma vez que celebra os 100 anos da caneta Meisterstück, indubitavelmente a peça mais importante da Montblanc. E vai revelar uma série de elementos que nos remetem para a Meisterstück de 1924, como "os desenhos originais da caneta ou os estudos para o símbolo do floco de neve", que adorna não apenas as tampas das canetas como as coroas dos relógios. Estes elementos "surgem muito discretos no mostrador, quase como se fossem um segredo", mas ganham outra vida no escuro, uma vez que estão banhados em super-luminova. 

No futuro, podemos esperar que a Montblanc vá subir ou descer? 

Ambas. Vai subir em vendas, mas também vai descer, porque vamos continuar a mergulhar... 

A Montblanc não tinha relógios de mergulho até o Laurent ter chegado – o que era natural, dada a sua história ligada à montanha. O que o levou a introduzi-los? 

Havia muitas ligações que me levaram aos relógios de mergulho. Os mostradores estão inspirados no glaciar do Monte Branco. O Reinhold Messner, o nosso grande embaixador, foi o primeiro a conseguir escalar todos os 14 cumes com mais de 8000 metros sem oxigénio suplementar, e agora contamos também com o William Trubridge entre os amigos da marca − e ele foi o primeiro a mergulhar para lá dos 100 metros de profundidade sem ajuda de oxigénio, por isso fazia todo o sentido. As vendas estão ótimas e já é a nossa coleção mais vendida. 

Não são todos os diretores de relojoaria que acompanham os seus embaixadores em aventuras radicais. Como foi correr uma maratona na Antártida? 

Propus ao Simon Messner ir à Antártida porque o pai dele (ndr. Reinhold Messner) foi o primeiro a fazer essa travessia, com o Arved Fuchs. E quando chegámos ao acampamento base estava lá uma foto enorme do pai dele, o que teve piada. Éramos praticamente os únicos a correr com relógios mecânicos no grupo, todos os outros usavam smartwatches e, quando reparavam nisso, olhavam para nós como se fôssemos esquisitos ou algo assim… Mas no final estavam todos à procura de um carregador. 

Passar por essas experiências é importante para o seu trabalho? Para o desenvolvimento dos relógios? 

Durante a corrida, descobri uma nova cor num glaciar. Estava a chover e criou um tom impressionante que vamos aproveitar num novo modelo, que sairá para o ano, por isso sim. Mas para mim é mais fácil, não apenas para ter novas ideias, como explicá-las melhor, dá-me outra legitimidade, afinal, sou o diretor da Montblanc e fui correr para a Antártida com os nossos relógios e fiquei em sétimo lugar entre quase 70 corredores. Sei do que falo, testei os relógios em condições reais. 

Tenho dúvidas sobre a importância real do oxigénio 0, porque nunca fiquei com um relógio embaciado. A não ser uma vez, em que estava ao sol a ferver e caiu num balde de gelo... 

É isso, em condições extremas acontece, e é nessa altura que faz toda a diferença retirarmos o oxigénio da caixa. Na expedição, aconteceu a vários, porque estamos na tenda a 20 graus, mas quando saímos podem estar menos 20. É um choque térmico muito grande. Além disso, sem oxigénio não há oxidação, e por isso melhoramos o tempo de vida útil de um relógio – e somos a única marca de relógios que o faz.

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