Da Europa para a América: a história das 'mug shots'
As mais famosas fotografias de rosto - na prisão - que ninguém quer ter no currículo, e que Donald Trump reavivou nos últimos dias.
Um pouco por conta das séries e filmes norte-americanos, é muito através dessa cultura visual que este nome nos é dado a conhecer. Para não falar nas variadíssimas pessoas que popularizaram precisamente por conta das suas mug shots, mesmo que já fossem algo famosas. É o caso de O.J. Simpson (1994), Robert Downey Jr. (1999), Nick Nolte (2022), James Brown (2004), ou Hugh Grant (1995).
Na história, também alguns rostos foram obrigados a ver os seus mug shots virem a público, devido à sua luta constante pelos direitos civis e humanos. Martin Luther King Jr. (1956), Rosa Parks (1956) e John Lewis (1961) foram exemplo disso.
Na era das redes sociais, a fotografia de Trump foi imediatamente partilhada e acabou por ter um resultado um pouco oposto ao que se esperava. O ex-Presidente e os seus apoiantes conseguiram transformar essa imagem numa espécie de medalha de honra. Desde então, depois do aproveitamento da foto de cadastrado, a campanha de Trump já arrecadou mais de 6,5 milhões de euros em donativos e venda de merchandising. T-shirts, canecas, bonés, e mais uma série de artigos, todos com a cara de Trump na prisão têm sido bastante procurados nos Estados Unidos.
Até os Greenday criaram t-shirts alusivas à capa de Nimrod, o álbum de 1997 que continha o êxito Good Riddance (Time of Your Life), trocando os rostos originais pelo de Trump. A t-shirt pode ser adquirida pelo preço de 35 dólares (32,42 euros), com as receitas a reverterem para o Greater Good Music, organização que apoia as vítimas dos incêndios em Maui, no Havaí.
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Mas esta relação entre a fotografia e as autoridades, mais especificamente à sua atividade de policiamento, já existe há muito. Pouco depois de ter sido inventada, em 1839, a tecnologia começou a ser utilizada para fins de identificação e vigilância. Em Paris, por exemplo, a polícia utilizou a fotografia nos esforços para identificar criminosos em série.
Na década de 1880, Alphonse Bertillon, antropólogo e chefe do Serviço de Identificação Judicial de França, inventou a mug shot, um retrato fotográfico duplo de rosto: uma foto voltada para a câmara e a outra de perfil. O retrato ainda pressupunha nove medidas físicas, que incluiam a largura da envergadura do braço, o diâmetro da cabeça, o comprimento do pé e o tamanho da orelha. Este sistema de Bertillon demonstrou que a fotografia não fornecia um registo transparente: necessitava de suporte textual. Chamada de Bertillonage, esta abordagem anunciava paradoxalmente a fotografia policial, ao mesmo tempo que sublinhava a insuficiência da identificação fotográfica.
A primeira foto policial (como as consideramos hoje) foi tirada a um prisioneiro em Bruxelas, Bélgica, em 1843. Uma década depois, a polícia britânica contratou um fotógrafo profissional.
Nos Estados Unidos, os departamentos de polícia começaram a fotografar homens e mulheres presos já na década de 1850 e exibiam os seus retratos para exposição pública em galerias de criminosos. Mais tarde, no século XIX, à medida que as fotografias se tornaram mais fáceis e baratas de reproduzir em impressões de papel, a fotografia policial foi amplamente utilizada nos departamentos de polícia de toda a Europa e dos Estados Unidos.
Esta técnica persistiu até hoje, embora as impressões digitais rapidamente se tenham tornado uma forma mais precisa de identificar criminosos. Ao longo do século XX, fotografias de líderes dos direitos civis a criminosos e celebridades, deixaram a sua marca.
Nos EUA, a prática de divulgar fotos policiais pode estar em extinção. Em 2020, a polícia de São Francisco anunciou que não divulgaria mais fotos policiais, a menos que houvesse um motivo de segurança pública. Acredita-se que esta partilha e proliferação de imagens nos jornais e nas redes sociais cria possa promover, de certa forma, o preconceito racial.
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