Como foi 2021?
Apesar da pandemia, da crise global e da escassez de matérias-primas, no ano de 2021 a indústria do Automóvel conseguiu ainda assim fazer alguns lançamentos de novos modelos e/ou novas gerações dos já existentes. São os casos do Audi Q5, VW ID.4, Hyundai IONIQ 5 e o seu "primo" Kia EV6, e de muitos, muitos outros que, melhor ou pior, lá foram recebendo as luzes da ribalta durante o ano que termina.
Mas à parte desta aparente bonomia, a indústria viveu, continua a viver, momentos de grandes desafios e enormes transformações. A pandemia de Covid, e principalmente os dois períodos de lockdown vividos em 2020 e 2021, desferiu um sério golpe sobre o Automóvel. A ponto de fazer perigar a sua própria sobrevivência. A falta de chips eletrónicos (e já aqui abordámos a temática) levou os contrutores a refrear a produção, e alguns mesmo a pararem pura e simplesmente as suas fábricas. Também as matérias-primas escasseiam: alumínio, metais raros, até sílica, imagine-se, é areia!
Do lado da indústria, o que nos vai trazer 2022?
Quando estará estabilizada a atual situação da produção industrial é a atual pergunta de mil milhões de dólares em Wall Street e nas restantes praças financeiras. Mas não deixa de ser sintomático que a indústria do automóvel já não seja a menina dos olhos dos fabricantes desses componentes, e tenha sido aparentemente preterida por eles a favor dos telemóveis, das consolas de jogos, da grande eletrónica de consumo, torradeiras incluídas. E mesmo quando tudo parecer estar finalmente sanado, ainda restará o problema da distribuição e da comercialização. Rotas marítimas esgotadas, falta de contentores e de navios que os carreguem, há marcas a vender carros com prazos de entrega de mais de um ano!
Novo paradigma: propriedade ou fruição?
Ou perguntado de outra maneira: o automóvel continuará a ser um bem de consumo – comprado e vendido – ou passará definitivamente a ser um mero serviço, que utilizaremos apenas quando precisemos dele? É que os primeiros ventos já se faziam sentir bem antes da pandemia: para quê deter a propriedade de um bem (um veículo automóvel) quando ele passará 90% da sua vida estacionado à porta de casa ou do emprego? Como investimento financeiro, convenhamos, é das piores ideias que se pode ter. Não será muito melhor pagar pela utilização desse bem como se fosse um serviço? Poderá sair mais caro nessa utilização pontual, irá com certeza, mas se pensarmos numa perspetiva do custo da viatura comprada, da sua manutenção, seguro, inspeções, e dividirmos pelo tempo de utilização que lhe damos na realidade, poderemos chegar à triste conclusão de que tinha saído mais barato atirar um saco cheio de notas pela janela. Esta é uma temática que não se resolverá de um momento para o outro, de um fim de ano para o início do seguinte – antes continuará a evoluir gradualmente e talvez no espaço de uma geração se possa olhar à volta e ver uma realidade bem diferente.
Elétricos: sim ou sopas?
A maré mudou há bastantes anos e parece inexorável no seu caminho para o domínio da mobilidade. O combustível fóssil viu-se, quase de um momento para o outro, vilanizado e acusado de tudo o que de mau aconteceu ao planeta nos últimos dois séculos. Mas nem tanto ao mar, nem tanto a terra: muitos comportamentos humanos e situações que fogem ao nosso controlo têm vindo a contribuir para o estado a que chegámos. Uma coisa é certa: a venda de veículos elétricos (VE) sobe, paulatinamente, ano após ano, e essa tendência está (é) imparável.
Lado negro da questão, como em tudo na vida: tal como na história da galinha dos ovos de ouro, o(s) Estado(s) – os parêntesis destinam-se a colocar o Estado português à cabeça – não resistem à tentação do lucro fácil e do enriquecimento rápido. Muitas taxas, taxinhas, custos, alíneas, contribuições, estão a ser criados do lado do abastecimento em eletricidade. Teme-se: carregar um EV irá ficar mais caro do que atestar com gasolina/gasóleo? Para todos os efeitos, quando abriram a barriga à galinha para retirar os ovos de ouro, ela morreu (!) e nunca mais pôs ovos.
E o que fazer às baterias em final de vida?
Pois, não é que ninguém tenha alertado para isso (vd. o português Carlos Tavares, quando ainda era "apenas" o CEO da Peugeot): o grosso das baterias produzidas para alimentar VE aproxima-se a passos largos do seu fim de vida estimado. E agora, o que fazer com elas? Enterrá-las longe da vista e do coração parece tudo menos ambientalmente correto. Usá-las para dar energia a grandes consumidores (como a Arena de Amesterdão, onde joga o Ajax) é muito bonito mas não chega, nem de perto nem de longe, para escoar tanta bateria. Reciclá-las para uso doméstico? Transformá-las em novas baterias e "injetá-las" de novo no circuito de fabrico? Alguma outra ideia luminosa e milagrosa? Que venham mais sugestões, porque para já o problema parece de muito difícil resolução – e ainda nem sequer começou...
Tanta pergunta, ainda tão poucas respostas
Infelizmente, os criadores do Automóvel não se lembraram de inventar, como opcional, uma bola de cristal. O futuro, que pode ser mesmo amanhã, continuará a ser sempre uma incógnita. Quem esperaria, ao ouvir as 12 badaladas de 1 de janeiro de 2020, que dois anos depois estaríamos onde estamos e teríamos passado pelo que passámos?
O Automóvel não parou de evoluir desde aquele longínquo janeiro de 1886, há 135 anos, quando Karl Benz registou a patente do estranho "veículo movido a gás" – sim, gás, ainda não havia gasolina, era um derivado de carvão. De lá para cá, atravessou transformações sociais e industriais, e é isso que continua a fazer, adaptando-se, melhor ou pior, ao que os tempos lhe vão ditando. Deverá ser assim também em 2022 – Feliz Ano Novo!