O antigo guarda-redes espanhol Zubizarreta contava numa entrevista, em 2020, que o mal-amado treinador do Barcelona Tata Martino tinha por hábito comentar que bastaria Lionel Messi ligar ao presidente para que ele fosse despedido. Não consta que tenha acontecido, mas, como reza o provérbio italiano: se non è vero, è ben trovato.
Há futebolistas que são muitos mais do que meros homens em calções a perseguir uma bola. Cristiano Ronaldo pertence a esse restrito leque de jogadores cujo perfil, personalidade e forma de estar na vida os eleva ao estatuto de verdadeiras estrelas pop. Com o argentino, Neymar ou Mbappé, os primus inter pares, Ronaldo tem o poder de promover ou de despedir treinadores ao sabor de vitórias ou derrotas.
A seleção portuguesa, que conta com o mais mediático de todos eles, já viveu um momento semelhante quando, em 2010, após a derrota por 1-0 também nos oitavos de final do Mundial, Ronaldo chutou as explicações para o treinador, ao responder à imprensa: "Falem com o Carlos Queirós." E a verdade é que, com o corte de relações entre ambos, a corda partiu pelo lado de quem é responsável por "montar" a equipa, o treinador.
Doze anos depois, é certo que Cristiano já não está no auge das suas capacidades tanto físicas e técnicas como parece também já não ser capaz de ter tanta influência nos corredores da Federação Portuguesa de Futebol (FPF). Mas com Fernando Santos com contrato até 2024 e sem Ronaldo abdicar de participar nos jogos da Seleção, coloca-se a questão: Quem irá ceder?
A paixão pelo futebol, esse derradeiro escape das sociedades democráticas, atinge em Portugal proporções dramáticas, tolda o pensamento e eleva a emoção acima da razão. Por cá, o futebol é, como terá dito Bill Shankly, muito mais do que um jogo de vida ou morte. A propósito do Mundial, foi escrito e comentado que Ronaldo não deveria dar entrevistas, que a seleção deveria ser "blindada" ao trabalho dos jornalistas, que os jornalistas deveriam abster-se de falar de temas que, afinal, são colocados na ordem do dia precisamente pelos intervenientes no jogo. E após semanas de discussão em torno das entrevistas de Cristiano, dos posts de Giorgina Rodriguez e de Kátia Aveiro no Instagram, media e fãs querem uma resposta. Num jogo de soma zero ou o campeão europeu (2016) e vencedor da Liga das Nações (2019) Fernando Santos cumpre contrato e Ronaldo terá de se habituar a não ter lugar cativo no onze titular ou Cristiano segue rei do balneário com outro treinador ao leme da equipa.
Será especulação dizer que hoje, segunda-feira, 12, será o Dia D quanto ao futuro da Seleção, mas, a avaliar pelo semblante carregado de Fernando Santos à chegada, ontem, ao Aeroporto de Lisboa, adivinha-se uma semana de longas conversas na Cidade do Futebol.
O jogo continua
Com a chocante derrota de Portugal frente a Morrocos, a equipa do norte de África qualificou-se para as meias finais do torneio, onde irá encontrar a seleção francesa (14/12, 19h). O outro jogo, entre Argentina e Croácia, disputa-se já amanhã, 13/12, pelas 19h. A final, entre os vencedores dos respetivos jogos, decorre no domingo, 18/12, às 15h.