No êxito I Just Call to Say I Love You (1984), Stevie Wonder faz parecer simples demais pronunciar a palavra "Amo-te" — esse pequeníssimo vocábulo tão simultaneamente meigo e poderoso. I Love You é, de acordo com um artigo publicado na revista Time, o título de pelo menos 47 músicas, 15 álbuns e 13 filmes, no que respeita a língua inglesa. Está, digamos assim, em toda a parte: não só é vocábulo evocado aos altos berros em músicas e filmes, como também é palavra escrita em livros, de hoje e de sempre, seja prosa, seja poesia. Está, efetivamente, em todo o lado e pronuncia-se naturalmente e com facilidade tremenda. Universo das artes à parte (porque nele tudo é possível) e de volta ao mundo real, as coisas não acontecem bem assim.
Dizer "amo-te" não é tarefa fácil. "Eu amo-te é algo que não se diz da boca para fora", pensamos. Dizemo-lo aos nossos filhos, podemos dizê-lo aos nossos pais e até desligamos um telefonema com os os nossos melhores amigos declamando um reconfortante e tão descomplicado "amo-te" — eu faço-o o tempo todo. Porém, quando muda o grau da relação, ou seja quando o assunto é relação amorosa, o caso muda de figura — e, olhando de repente para o termo "relação AMOROSA", fica ainda mais difícil de entender o porquê. Há dias um amigo expressava precisamente esta dificuldade: "Eu amo-a, mas não o consigo dizer", desabafava. Eu entedia-o — e como entendia… Digamos que passei anos de terapia a tentar compreender este issue. Ainda assim perguntava-lhe o porquê dessa sua adversidade. Qual o bloqueio instalado no seu âmago que não permitia nem por nada que tais palavras passassem do coração à boca e da boca à verbalização das mesmas: "Receio admitir que fico nervoso com o que vem depois. Há algo que acompanha a pronunciação dessa pequena palavra. É como se tal demarcasse uma transição no relacionamento. Então, depois ficamos à espera que se diga uma e outra vez. Geralmente não se acaba uma relação com alguém a quem se acabou de começar ‘a amar’. Quando dizemos ‘amo-te’ não há volta a dar", dilucidava o meu amigo. Medo, portanto.
Num artigo publicado no Psichology Today a propósito deste tema, o autor acrescentava outro ponto: "Alguns homens podem achar mais difícil ter as tais demonstrações de afecto devido a estereótipos sobre a masculinidade. Eu costumava acreditar no mito que defendia que ‘machos durões’ não tinham esse tipo de ‘sentimentos piegas’ como é o amor. O que não poderia estar mais longe da verdade. Algumas das pessoas mais ‘duras’ que conheço têm os corações mais brandos e o amor mais feroz", deslindava. E, tentando entender o amor, o autor somou a seguinte citação da autoria de Robert A. Heinlein (1907 - 1988): "O amor é aquela condição em que a felicidade de outra pessoa é essencial para a sua". Esta definição parece encaixar-se em muitos dos nossos relacionamentos íntimos e suspeito que a maioria de nós gostaria de ser amado daquela maneira. Então por que é que temos tanto medo de articular a palavra "Amo-te"? A psicóloga Rita Fonseca de Castro, da Oficina da Psicologia, elucida-nos com alguns dos principais motivos por detrás deste pequeno terror.
A vida é curta e, em tempos de crise como este que atravessamos hoje, ainda mais frágil se torna e, quem sabe, breve. Por isso pegue no telefone e, sem medos, avance de vez com aquele ‘amo-te’ que lhe está engasgado na garganta. Vai ver que não dói nada. Ps: I love you