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Isto Lembra-me Uma História: Donald Trump, o condenado das mãos pequeninas

O antigo Presidente dos Estados Unidos, e futuro candidato do Partido Republicano às presidenciais de 2024, foi condenado por todos os crimes de que era acusado. A revista The New Yorker não perdeu tempo e pôs de imediato as algemas nas mãozinhas de Trump.

Foto: Getty Images
02 de junho de 2024 | Diogo Xavier
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A revista ainda não saiu, mas assim que se soube que Donald Trump tinha sido condenado por todas as 34 acusações do crime de falsificação de documentos, a imagem correu mundo nas redes sociais. A capa da The New Yorker, com lançamento marcado para 10 de junho, mostra uma ilustração caricatural do ex-Presidente dos Estados Unidos da América, no seu tradicional fato azul com longa gravata vermelha, estendendo as mãos para um outro par de mãos, que seguram umas algemas. Reformulo: estende as mãozinhas, pequeninas e curtas, descabidamente desproporcionais, para um par de algemas agarrado com delicadeza, cujas argolas são manifesta e desajustadamente maiores do que os pulsos que procuram deter.

"A Man of Conviction", é esse o título da ilustração de John Cuneo, jogando com o duplo sentido da palavra "conviction", que significa, em português, "convicção" e também "condenação". Temos, portanto, um Trump, "um homem de convicções", ao mesmo tempo que o podemos ler como "um homem condenado". E esta dupla descrição de Donald John Trump - americano branco de 77 anos, nascido no bairro etnicamente diversificado de Queens (28,2% hispânicos, 26,1% asiáticos, 22,9% brancos, 16,2% negros), em Nova iorque, a 14 de junho de 1946 (está quase, quase a fazer 78) - a que melhor serve para apresentar o antigo Presidente. Obstinado, truculento, desrespeitoso, infrator e, finalmente e depois de muitas décadas de práticas no mínimo duvidosas, condenado (escrevo estas linhas e remato com um longo suspiro de "até que enfim").

Foto: Getty Images

O júri que considerou Donald Trump culpado das 34 acusações ("guilty on all charges") desencadeou um processo que se adivinha longo. Para começar, esta condenação não impede, para já, Trump de concorrer às eleições presidenciais de novembro. Depois, ainda não chegámos sequer à parte em que o condenado pode recorrer da sentença, porque a sentença ainda não foi lida - a leitura está agendada para dia 11 de julho, nas vésperas da convenção nacional do Partido Republicano em que Donald Trump será apresentado como o candidato do partido às presidenciais. Serão, sem dúvida, dias agitados e preenchidos na vida do líder espiritual do culto MAGA - Make America Great Again, e muitos dos seus acólitos não se conformam com esta maldade que a justiça dos EUA decidiu cometer contra o seu ídolo. O antigo Presidente já veio publicamente instigar ao pensamento coletivo dos seus seguidores, "se me fazem isto a mim, imaginem o que vos pode acontecer a vocês!", disse, dando início a um processo de reflexão, levando pessoas a concluir que, cometendo crimes dados como provados em tribunal, era possível que acabassem detidos pelas autoridades. O culto trumpista estremeceu: que horror, que raio de invenção.

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Donald Trump não é estreante no papel de vítima. É prática recorrente do antigo Presidente colocar-se no centro de uma narrativa conspirativa em que a injustiça do mundo e a maldade dos homens o acossam constantemente, logo a ele, um ser humano imaculado cujo currículo de patifarias - com mulheres, com negócios, com discursos, com influências, com amizades (e uma em especial, com Jeffrey Epstein, que dará certamente uma boa história) - seria demasiado longo para incluir num só texto. Quando perdeu as eleições para Joe Biden, não reconheceu a legitimidade da vitória do adversário, tendo preferido lançar novas teorias e suspeitas sobre manipulação de resultados, o que levou, em última análise, ao episódio mais cringe da história recente, com milhares de pessoas mascaradas - quem não se lembra so "xamã QAnon" Jacob Chansley em tronco nu e com um barrete de cornos na cabeça, a vandalizar o Capitólio? - a invadirem os edifícios de Washington, D.C., para tentarem tomar o poder que consideravam ter sido usurpado das mãos de Trump. Este é só um exemplo, possivelmente o maior e mais fiel de todos, do que Trump pode fazer e do quão nocivo pode ser para a sociedade americana - e isto não inclui qualquer julgamento comparativo com adversários políticos, é uma constatação simples a partir de factos concretos e documentados (até porque hoje em dia será bastante difícil a qualquer pessoa de bom senso defender as políticas de Joe Biden, nomeadamente em relação à questão israelo-palestiniana).

Foto: Getty Images

Voltando à capa da New Yorker e às mãos pequeninas de Trump, que tantas vezes têm sido mencionadas e aludidas desde há muito tempo - serão um mito? Será que são mesmo assim tão pequenas? Marco Rubio, antigo rival de Trump no Partido republicano, em 2016 disse qualquer coisa como "já viram bem aquelas mãos? Sabem o que se diz de homens com as mãos pequenas - não se pode confiar neles". Nessa altura, a tirada não passou de jogo baixo enquadrado no espírito de baixaria que caracteriza as campanhas políticas recentes nos Estados Unidos. Mas a verdade é que podemos recuar até 1988 para encontrarmos uma alusão clara ao tamanho diminuto das mãos do antigo Presidente americano.

Há mais de 35 anos, Graydon Carter, que foi editor da Vanity Fair de 1992 a 2017, descreveu Donald Trump na Spy Magazine do seguinte modo: "Um ordinário de dedos curtos." Contundente. Num editorial publicado na Vanity Fair em novembro de 2015, um ano antes da eleição de Trump como presidente, Carter recordou o comentário e admitiu que a sua intenção era só "fazê-lo perder um bocadinho a cabeça". Claramente, resultou: Trump detesta que aludam ao tamanho das suas mãos (aparentemente, o facto de lhe chamarem "ordinário" não o incomoda assim tanto). "Como tantos outros bullies, Trump tem ‘pele de princesa’", acrescentava Graydon Carter, que revelou um detalhe notável desta sua estranha relação com o antigo Presidente: "Ainda hoje continuo a receber o ocasional envelope de Trump. Contém sempre uma fotografia dele - normalmente, uma página arrancada de uma revista. Em todas as fotos, ele desenha círculos dourados em torno das mãos num esforço valoroso para dar ênfase ao comprimento dos seus dedos", escreveu Carter. "Quase que sinto pena do pobre coitado porque, para mim, os dedos continuam a parecer-me anormalmente atarracados, como pequenos tocos."

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Graydon Carter revela, ainda no mesmo texto, que, no ano em que decidiu concorrer para Presidente dos EUA, Trump lhe enviou o tradicional envelope com uma fotografia e um círculo em torno das mãos, e ainda uma legenda a dizer "estás a ver? Não são assim tão pequenas". Uma vez mais, Donald Trump não aceitava a realidade e as evidências, preferia impor a sua perspetiva, ainda que parcial e adulterada dos factos. Carter devolveu o envelope ao remetente, mas não sem antes ter acrescentado à foto um pequeno comentário: "Na verdade, são bastante pequenas."

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