Jacob Rothschild, o 4.º Barão de Rothschild, morreu a 26 de fevereiro, aos 87 anos. A notícia correu mundo, com a discrição adequada a uma figura que não seria exatamente a mais célebre e popular entre as personalidades do mainstream, mas com o sublinhado apropriado ao desaparecimento de alguém que ostenta o nome de uma família que, em princípio, toda a gente conhece, ainda que boa parte das pessoas não saiba ao certo porquê.
Antes de mergulharmos nesse aparente contrassenso, façamos um pequeno à-parte: Rothschild. Afinal, como é que se pronuncia esse nome? Os anglófonos, como de costume, adaptaram o apelido às suas maneiras, passando por cima de todas as regras de pronunciação e ignorando por completo a origem judaico-alemã do apelido. Ingleses, americanos e outros dizem "roth - child", pronunciando o final da palavra do mesmo modo que pronunciam "criança" em inglês. Embora tenha mediaticamente feito escola, e apesar de Jacob Rothschild ser inglês de nascimento, esta maneira de dizer o vetusto nome dos barões está errada. Diz-se "rot-shield", pronunciando-se "i" e não "ai". O nome significa "escudo" ("schild") "vermelho" ("rot") e deriva da expressão alemã "zum rothen Schild", "para o escudo vermelho".
Voltemos ao início desta história: em princípio, será de conhecimento geral que os Rothschild são uma família poderosa e endinheirada, cujo apelido surge amiúde em muitos dos momentos-chave da história do mundo ocidental ao longo dos últimos mais de 100 anos. Mas de onde lhes vem a notoriedade e o poder? Quem era Jacob Rothschild e, se ele era o 4.º barão de Rothschild, quem lhe precedeu?
Nathaniel Charles Jacob Rothschild nasceu a 29 de abril de 1936 em Cambridge, Inglaterra, no seio da poderosa e notável família de banqueiros de quem herdou o apelido. O próprio Jacob acabou por tornar-se banqueiro, iniciando a carreira no banco NM Rothschild & Sons, antes de começar sozinho o seu fundo de gestão de fortunas. Além da vida profissional, Jacob tornou-se célebre pelas suas facetas de colecionador de arte e de filantropo. Em relação à vasta coleção de arte que foi construindo, ela inclui dois quadros extraordinariamente especiais: dois retratos de Rothschild, um pintado por Lucien Freud, outro por David Hockney. O barão tornou-se mesmo amigo de Freud no seguimento de um pedido de ajuda - o pintor precisou de dinheiro para pagar uma dívida que o punha em risco e o magnata não o deixou ficar mal. Desde então, os dois mantiveram uma relação de amizade.
Profissionalmente, a carreira de Jacob começou no banco da família, mas não no cargo mais alto. O pai de Jacob, Victor, abdicara da presidência do conselho de administração, depois de ter optado por seguir uma carreira diferente, dedicada à ciência. Assim, um novo ramo da família assumiu a maioria dos votos decisivos e o primo distante de Jacob, Evelyn Robert de Rothschild, ficou à frente dos destinos do banco. Jacob acabaria por vender a sua fatia minoritária das ações e fundar o Rothschild Investments Trust. Além do fundo de gestão, o barão teria interesses e investimentos dispersos por negócios relacionados com petrolíferas.
A fortuna da família Rothschild, ou, mais concretamente, deste ramo da família Rothschild a que Jacob pertencia (o ramo inglês), está estimada, segundo a lista de ricos do Sunday Times, em cerca de 825 milhões de libras, o que dará pouco menos de 965 milhões de euros. Ao nível dos grandes magnatas da alta finança mundial, não é uma fortuna formidável - e basta pensarmos que Jacob Rothschild foi o presidente de uma subsidiária da Rothschild Investments Trust, a RIT Capital Partners, que chegou a valer em bolsa mais de dois mil milhões de libras; ou podemos assinalar que um antepassado seu, Ferdinand de Rothschild, mandou construir a Waddesdon Manor, um castelo neo-renascentista numa vila de Buckinghamshire a que chamavam "Rothschildshire", tal era o número, a vastidão e a imponência das propriedades da família na região.
Os primeiros documentos que atestam a história dos Rothschild remontam ao século XVI, em Frankfurt, e demonstram que o apelido da família deriva do nome da casa do clã, chamada Rothschild, e que foi construída naquela cidade, hoje alemã, em 1567. A influência e a fortuna original dos Rothschild começam a formar-se no século XVIII, precisamente em Frankfurt. Foi naquela cidade livre do Sacro Império Romano-Germânico que, na década de 1760, o judeu da corte Mayer Amschel Rothschild começou a prosperar. Os judeus da corte eram, naquela época, gestores financeiros judeus que emprestavam dinheiro à nobreza e à realeza nos países do centro da Europa.
O que diferenciou Mayer Rothschild dos demais judeus da corte foi o facto de ele não ter deixado que o seu negócio ficasse circunscrito à nobreza da cidade. Pelo contrário, o empreendedor Mayer estabeleceu uma rede internacional de bancos através dos seus cinco filhos. Assim, as empresas financeiras Rothschild expandiram-se para Londres, Paris, Viena e Nápoles, além de Frankfurt. A influência e o poderio económico dos Rothschild levou a que a família ascendesse aos títulos nobiliárquicos no decorrer do século XIX, tanto no Sacro Império como no Reino Unido. O primeiro barão de Rothschild foi Nathan Mayer (1840-1915) que, além de banqueiro, foi também político. Nathan Rothschild foi o primeiro judeu a ter assento na House of Lords do Reino Unido, depois de ter também ocupado lugar na House of Commons.
A família Rothschild, reunindo os seus vários ramos (alemão, austríaco, francês, napolitano e inglês), possuía a maior fortuna privada do mundo durante o século XIX. Essa fortuna veio a perder exuberância por várias razões, que vão das mudanças naturais na distribuição de riqueza até às alterações que decorrem da gestão e da origem do dinheiro. No casos dos Rothschild, houve ainda um outro ingrediente a contribuir para que a família tenha perdido o título de "a mais rica do planeta" (o que está longe, muito longe, de significar que tenham deixado de ser multimilionários): a descendência. Com as suas múltiplas ramificações, os Rothschilds têm várias gerações repletas de herdeiros que, por sua vez, também deram ao mundo vastas descendências.
O facto de ter deixado de ser a família mais rica do planeta no século XX não retirou, no entanto, poder e influência aos Rothschild. Um exemplo flagrante dessa influência é a Declaração de Balfour, de 1917. Essa missiva de uma página viria a ter uma importância fundamental no decorrer da história do século seguinte, e que se estende até aos dias de hoje, como se pode constatar em cada noticiário. Nessa Declaração, Lord Balfour, então secretário dos Assuntos Estrangeiros (o equivalente ao nosso ministro dos Negócios Estrangeiros), dirige-se a Lord Rothschild - Lionel Walter, 2.º barão de Rothschild - para lhe garantir que o Governo da Coroa do Reino Unido vê com grande simpatia a ideia e envidará todos os esforços no sentido da criação de um estado judaico no território da Palestina, que era, à época, parte do Império Otomano. A Declaração de Balfour é datada de 2 de novembro de 1917 e foi publicada na imprensa a 9 de novembro do mesmo ano. Porém, a intenção de transformar os territórios da Palestina em "um lar nacional para o povo judeu" vinha sendo cozinhada nos bastidores do poder desde 1914, quando o lóbi sionista começou a pressionar o Império Britânico logo após a declaração de guerra aos otomanos. E o nome dos Rothschild é indissociável desse grupo de pressão.
Jacob Rothschild deixa para trás uma grande herança, um património gigantesco, uma imagem de generosidade, de bom gosto e de finésse. E deixa, bem a propósito, uma frase lapidar: "Vivemos em tempos de muita incerteza."