Quando comecei a trabalhar a partir de casa, já lá vai um par de anos, uma das coisas que me apercebi é que estar em casa revelava-se um tanto ou quanto perigoso no que respeita a fome (ou, diria antes, a vontade de comer). E porquê? Porque passar dias seguidos em casa (apesar das naturais pausas — não estava de quarentena) pode ser extremamente aborrecido. E o aborrecimento, por sua vez, pode muito bem ser uma das principais causas para a vontade de comer — que está longe de ser fome, enquanto necessidade fisiológica. Assim, tive de reaprender a conviver com a comida em casa.
Vi-me forçada a delinear hábitos saudáveis que, como em tudo na vida, após muita prática acabaram por se tornar naturais. E então essa mania de ir procurar conforto na comida em momentos de tédio, passou. "Para a maior parte das pessoas, comer não é só um ato fisiológico", assegura a nutricionista Mariana Abecasis. "Existe uma parte emocional que condiciona o apetite. Na maioria das vezes não são necessidades reais, mas a verdade é que procuramos na comida conforto e consolo". Converso com aquela nutricionista por telefone, estamos ambas em casa e distraímos-nos enquanto trabalhamos — e, caro leitor, conforme verá mais à frente, manter-se distraído é meio caminho andando para o combate a "essa" fome que o assola. Mariana Abecasis explica que, em tempos como os que estamos a presenciar, em que andamos mais ansiosos, talvez até tristes e preocupados (cada caso é um caso), este tipo de fome que em nada é uma necessidade, pode despontar. "É natural que esta fase de isolamento mexa com o sistema nervoso e emocional das pessoas, no geral. E, como estamos em casa, temos mais disponibilidade para comer. No quotidiano normal passávamos tanto tempo em correria que, muitas vezes, até nos podíamos esquecer de fazer certas refeições, já que estávamos sempre ‘muito ocupados’. Porém, em casa temos mais atenção aos nossos sentimentos. É realmente provável que se sinta mais fome nestas circunstâncias que estamos a testemunhar".
Além disso, existe uma vertente psicológica muito forte que se prende com a questão da disponibilidade dos alimentos: "Só de se saber que se pode vir a não ter acesso a certos e determinados alimentos, fica-se com mais vontade de os ter e de os consumir", adianta aquela nutricionista. Perante este cenário, como contrariar este tipo de fome "falsa" e como assegurar uma quarentena saudável, física e psicologicamente? Mariana Abecasis aconselha.
Se ainda assim a sua pseudo-fome subsistir, telefone a um amigo, partilhe, dance, cante, e acima de tudo distraia-se. Não vai querer acabar a quarentena sem o vírus, mas com mais dez quilos em cima, vai?