No último mês de 2012, o Las Ficheras instalou-se em pleno Cais do Sodré e não mais de lá saiu. Habituou-nos mal, e nestes quase dez anos tornou-se uma referência no domínio dos restaurantes mexicanos, sobretudo agora. Se na época existiam dois ou três restaurantes do género, a oferta multiplicou-se vertiginosamente.
"Temos de nos estar sempre a reinventar, senão morremos na praia", declara Patrícia Camacho, proprietária. Na proximidade de um aniversário simbólico como este, fez sentido "recuperar um património que na época tivemos medo de assumir", desvenda, referindo-se ao próprio nome do espaço, ainda desconhecido para muitos.
No México, as ficheras eram mulheres das casas de alterne cujos serviços vários eram requeridos por meio de um sistema de fichas coloridas. Mais tarde, nos anos 70 o fenómeno deu origem ao género cinematográfico Cine de Ficheras. Nestas peliculas eróticas, mas não explicitas, destacou-se o trabalho da atriz Sasha Montenegro, "a fichera mais famosa e bonita do México".
O conceito base foi recuperado e agora Sasha tornou-se o espetáculo de pole dance que anima as noites de quinta, sexta e sábado do restaurante, com bailarinas da Pole Dance Portugal. O varão estrategicamente situado junto à janela atrai os transeuntes, ao jeito red light district, mas o número termina cedo, às 22h30. "É uma dança erótica, sem ser hardcore, era importante para mim esta distinção", avança Patrícia Camacho. Aqui as fichas amarelas, azuis e vermelhas permitem pedir, respetivamente, mais bebidas, shots para uma mesa ou mais uma dança. A noite segue com os dois DJs residentes. As luzes baixam, o volume aumenta e o bar enche-se de malta jovem, sobretudo aos fins de semana.
Nesta fase, tornou-se também importante acrescentar novidades a uma carta, que primou desde cedo pela qualidade do produto. "Sempre quisemos fugir da comida de plástico, dos sombreros para turista e dos restaurantes de Miami e Cancun", declara a proprietária.
Surge o sedutor Taco Xochitl (€11), cujo nome remete para flor e chama pela estação quente com pétalas coloridas e tentáculos de polvo sob um puré de pimentos e crocante de alho francês. Já nas bebidas entra o cocktail Melon Baby (€9), um refresco de cor veranil com tequila, servido com uma pastilha elástica de melão e que se torna bastante doce e apetecível.
Nos prediletos dos habitués, para além das entradas de Nachos com Carne (€7,90) e Guacamole e Totopos (€7,70) e do trio de sobremesas (€15) que combina mousse de chocolate e café, cheesecake de lima e churros com doce de leite, quem reina são os tacos e os burritos.
Para desgosto de Patrícia, que ainda não perdeu a esperança de trazer o verdadeiro México para cima da mesa. "Queremos algo mais autêntico, mais Cidade do México e menos Tulum", suspira enquanto nos fala de planos futuros onde entram enchiladas, flautas e mole poblano (frango com chocolate). A vontade trouxe-a das múltiplas viagens de inquirição por aquela capital e a altura parece propícia "as pessoas estão todas a ir ao México agora e eu gostava que conhecessem a verdadeira gastronomia do país".
Num balanço de quase uma década fala-nos com entusiasmo e em off de um projeto novo a acontecer brevemente e mune-se de "histórias e memorias construídas, com a certeza que o melhor está para vir", mas com o reconhecimento e sensatez de quem já tem uma vasta experiência na área e sabe que na restauração "cada dia é um dia".