Produtores, enólogos, distribuidores, empresas turísticas, garrafeiras, restaurantes, bares, chefs, todos os que se relacionam com o tema vinho, além do negócio tradicional, têm vindo a estreitar relações com os consumidores através do enoturismo, um setor ainda pouco regulado, mas em crescimento em Portugal. A presidente da Associação Portuguesa de Enoturismo (APENO), Maria João de Almeida confirma que, mais do que uma tendência, "é uma realidade cada vez mais sólida". Por cá, o fenómeno surgiu por volta dos anos 90, "paralelamente ao aumento qualitativo dos vinhos portugueses e uma oferta/diversidade crescente que até aí não existia", sublinha.
Para a dirigente, enoturismo não se se resume a uma prova de vinho, vindimas, ou um espaço para dormidas. O conceito é uma agregação de atividades turísticas que se centra "na experiência motivada pela apreciação dos vinhos, associada às tradições e cultura locais, seja em ambiente rural ou urbano". A presidente da APENO acrescenta que "em qualquer local onde estejamos a provar um vinho e a conhecer a história do produtor estamos a fazer enoturismo".
The Vine House é uma das mais recentes propostas de enoturismo no país e resulta da vontade do grupo Sogevinus (que detém marcas como a Cálem, a Kopke, a Burmester a Barros ou a Quinta da Boavista), com a ideia de proporcionar uma experiência autêntica no ambiente de uma quinta vinhateira no Douro. Foi pensada para os apreciadores deste tipo de turismo, até porque proporciona aos hóspedes a oportunidade de acompanhar o dia-a-dia da Quinta de S. Luiz em Tabuaço, entre a Régua e o Pinhão. Os 11 quartos, todos com vista para o rio Douro, ficam na antiga casa de família, recuperada, com mais de 200 anos. As provas detalhadas dos vinhos feitos na quinta, os circuitos de visita ao processo de produção e a visita a pontos de interesse no interior dos 125 hectares da propriedade, são algumas das sugestões.
Ainda no Douro, a Churchill’s abre as portas da Quinta da Gricha para "a descoberta de uma autêntica vindima no Douro". São dois fins-de-semana em setembro, onde os participantes podem vindimar, pisar as uvas e provar os seus vinhos do Porto e Douro. Ao chegar à quinta, os convidados trocam de roupa para o seu "Kit Douro" que depois podem levar para casa. O almoço, baseado na gastronomia tradicional, é servido no Pátio das Laranjeiras. Entretanto, no Porto, a casa reabriu o 1982 Bar no jardim das suas caves em Gaia.
A sul, uma das casas mais emblemáticas do Alentejo, João Portugal Ramos, tem propostas de enoturismo concebidas a pensar em momentos partilhados em família e experiências de "team building". São propostas que estão disponíveis durante todo ano que vão desde um passeio pelas vinhas, visita à adega e às caves, provas de vinhos, almoços ou até procurar uma garrafa escondida num "escape room" adaptado à Adega Vila Santa. "Ser Enólogo Por Um Dia", participar nas vindimas e pisar as uvas nos lagares de mármore durante o mês de setembro, ou participar em workshops de cozinha tradicional alentejana são outros exemplos.
Também no coração do Alentejo a Herdade do Rocim junta os visitantes aos produtores de vinhos de talha num roteiro turístico. A "Amphora Wine Tour" leva os turistas a locais como a Honrado Vineyards, Gerações da Talha, XXVI Talhas, num programa abrangente e interativo. Além do mundo dos vinhos de talha, há outras provas, harmonizações, degustação de buchas ou tábuas alentejanas, experiências nas vinhas e atividades para grupos, grandes ou pequenos. A Herdade do Rocim também abre as portas dos 120 hectares, dos quais 70 são de vinha e 10 de olival, de cultivo em regime biológico.
A duriense Lavradores de Feitoria propõe uma visita e cinco provas de vinhos distintas, em grupo ou em privado. A ideia é conhecer a Quinta do Medronheiro e história da casa através de uma visita guiada e provas comentadas. Eduardo Ferreira, um anfitrião da terra, recebe os convidados e conta histórias da vinha e do vinho. Também há visitas privadas e a experiência "Enólogo por um dia".
Ainda no Douro, a Quinta do Pôpa comemora 10 anos de portas abertas e apresenta novos programas de enoturismo. "Da horta para a mesa" que pretende ser uma experiência 100% vegan, o programa de "Picnic à do Pôpa" e a prova de vinho tinto de vinhas velhas ainda a estagiar em barricas. A quinta disponibiliza bicicletas e mapas para passear livremente. Além destas possibilidades, pode-se visitar as infraestruturas de produção e, na loja, diferentes tipologias de provas que podem ser acompanhadas por tábuas de petiscos, mas também merendas ou brunchs, sem perder os olhos do rio Douro. Os responsáveis avisam que é ideal para famílias, uma vez que tem espaços dedicados às crianças e "pet friendly".
A sul, a marca Mainova disponibiliza todos os produtos na Herdade da Fonte Santa, no Vimieiro, Alto Alentejo, e ainda abriu a "Mainova Wine Art Gallery". É um espaço particularmente dedicado a experiências de enoturismo e conta com visitas à adega, às vinhas e ao olival, além de provas de vinho e azeite, e eventos feitos à medida.
O enoturismo na casa Soalheiro conta a história dos 40 anos com novas experiências para conhecer. Provas exclusivas num espaço renovado no ponto mais a norte de Portugal: a região de Monção e Melgaço. Além das provas de vinhos (entre os quais o inevitável Alvarinho) e infusões, ainda se pode usufruir de harmonizações gastronómicas com produtos típicos da região e da possibilidade de alojamento na quinta. As visitas à vinha, ao campo das infusões, à adega, cave da inovação e programas com parceiros locais para explorar o território até ao Parque Nacional Peneda-Gerês, completam a oferta.
Quase todas as grandes marcas têm apostado no enoturismo, como é o caso da 1990 Premium Wines (grupo Global Wines) para as áreas de vinhos premium e de enoturismo. Este ano a sua principal área de investimento é a do enoturismo, onde a ideia passa por criar experiências que permitam avaliar o vinho no seu contexto original, perceber as suas diferenças, a sua história e a sua personalidade, associando-o à gastronomia, ao património, à cultura e à riqueza da região. A 1990 Premium Wines tem vários espaços sob a sua gestão, como o restaurante de cozinha de autor e fine dining Paço do Cunhas, em Santar, o restaurante e as adegas da Quinta do Encontro, na Bairrada, e a Herdade Monte da Cal no Alentejo.
Os prémios ajudam a promover as sugestões e, neste caso, a Casa das Pipas, unidade de enoturismo da Quinta do Portal, conseguiu pela 14ª vez consecutiva o prémio «Chave Verde», atribuído pela Associação da Bandeira Azul da Europa. Na casa gasta-se energia com certificado ambiental ou renovável, há planos de redução de resíduos e sinalização e ainda o mapeamento para transportes públicos, percursos pedestres e ciclovias. Os 12 quartos da Casa das Pipas ficam em Celeirós do Douro, Sabrosa, num complexo enoturístico da Quinta do Portal considerado pela revista Forbes como um dos melhores dez destinos vinhateiros do mundo.
Nas quintas da família Amorim, Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo no Douro e Taboadella no Dão, há inúmeras propostas. Na propriedade duriense está disponível uma "viagem no tempo" durante a visita ao Museu Fernanda Ramos Amorim, um ex-libris da região. São 85 hectares de vinha e a possibilidade de conhecer onde idealizam e concretizam os vinhos: a adega e sala das barricas. Há provas de vinhos e petiscos, experiências que permitem ser enólogo por um dia e passeios de barco. A sul, a Wine House da Taboadella que acolhe loja e sala de provas está aberta a visitantes. Provas de vinhos com os melhores queijos da Serra da Estrela e outras iguarias tradicionais da região são opções a par das caminhadas pelos antigos vestígios romanos. Merendas na vindima, brunch e menus na Casa Villae 1233, disponível para aluguer, são algumas das propostas da Quinta da Taboadella.
Na primeira edição do Prémio Nacional de Enoturismo APENO 2022, os jurados elegeram como "Melhor Enoturismo de Portugal" a Herdade da Malhadinha Nova. Nos 450 hectares da propriedade em Albernoa, em Beja, há espaço para inúmeras atividades desde programas culturais, em família, radicais ou românticos. Há quartos, suites e villas, uma loja, uma taberna, um restaurante, um spa e uma coudelaria com cavalos puro-sangue lusitano.
A presidente da APENO, Maria João de Almeida, garante que, no que diz respeito à qualidade dos enoturismos, "há exemplos maravilhosos de referência" e, acrescenta, "havendo vontade de trabalhar e oferecendo um bom serviço, somos tão bons como qualquer outro país". A responsável salienta que a Associação Portuguesa de Enoturismo tem chamado a atenção para a necessidade de um estudo, de uma CAE (Classificação de Atividade Económica), de um código IRS e de regras de orientação específicas para o setor.
Relativamente aos vinhos e turismo, Maria João de Almeida não tem dúvidas que provar um vinho que conhecemos ou não, são situações completamente distintas. Ou seja, acrescenta: "Se eu conheço um produtor, a sua propriedade, a sua história, vou apreciar o vinho de uma forma igualmente diferente". Por isso, sugere que "saber contar uma história, comunicá-la bem e de forma eficiente é, sem dúvida, uma das melhores formas de alavancar o enoturismo". A presidente da APENO conclui que voltar mais vezes ao lugar onde provou um vinho que gostou, "pode levar também outras pessoas a fazer o mesmo".