Prazeres / Sabores

Cidade do Vinho: o motivo perfeito para descobrir a Serra d’Ossa

Alandroal, Borba, Estremoz, Redondo e Vila Viçosa são os municípios que, em conjunto, foram eleitos Cidade do Vinho 2025. O título serve de mote e desafio para explorar e descobrir este recanto do Alto Alentejo.

Foto: Getty Images
Ontem às 17:30 | Diego Armés
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O que é que a Serra d’Ossa tem que mais nenhuma terra de vinhos tem? Esta era a dúvida mais inquietante, a questão mais pertinente que levávamos na cabeça quando assistimos à gala inaugural da Cidade do Vinho 2025, que este ano consagra Alandroal, Borba, Estremoz, Redondo e Vila Viçosa com aquela distinção, sucedendo a Almeirim, Alpiarça, Cartaxo e Santarém, a "cidade" também conjunta de 2024.

Cidade do Vinho é um projeto promovido pela AMPV - Associação de Municípios Produtores do Vinho desde 2009 com o objetivo de "valorizar a riqueza, a diversidade e as características comuns dos territórios associados à cultura do vinho". A AMPV elegeu a candidatura conjunta daqueles cinco concelhos do Alto Alentejo que, respondendo ao desafio lançado pelo município de Borba, se uniram em torno do elemento que partilham, o território ao qual pertencem: a Serra d’Ossa.

Sublinhando o ponto de partida da candidatura, a cerimónia de abertura da Cidade do Vinho 2025 realizou-se no Pavilhão Multiusos de Borba, naquele que foi o primeiro de vários eventos no âmbito do projeto que irão ter lugar ao longo de todo o ano. Sob o lema da candidatura, "Vinhos da Serra d’Ossa - Identidade e Futuro - Marcas que deixam hiostória", a Cidade do Vinho 2025 terá uma programação recheada de encontros, eventos, mostras e experiências em torno do vinho e da gastronomia da região, como um todo, e das várias terras que a compõem, cada uma com as suas singularidades.

Na gala de abertura, como não podia deixar de ser, foram dados a provar vinhos de todos os municípios envolvidos, com a participação de produtores da região, reunindo no Multiusos de Borba desde os vinhos mais artesanais até aos mais conhecidos e com grande volume de produção. Da programação - que pode ir sendo consultada na página de Instagram, com atualizações regulares -, merecem destaque a comemoração dos 18 anos da AMPV, em abril, no Alandroal, vila que acolhe ainda o Festival de Peixe do Rio, em março; Borba vai receber, entre outros, o Festival da Vinha e do Vinho, em novembro; em Estremoz realizar-se-á a Feira Internacional de Agropecuária, em maio; Vila Viçosa terá o seu momento com a Festa dos Capuchos, em setembro; e Redondo terá a festa das Ruas Coloridas, em agosto. Pelo meio, haverá muitas festividades dedicadas a pratos e tradições regionais, tudo sempre devidamente emparelhado com os vinhos da região, pois claro.

Além destas notas de agenda, importa destacar a participação da delegação da Cidade do Vinho 2025 na BTL - Bolsa de Turismo de Lisboa, agendada para março, e ainda na Feira Nacional de Agricultura (previsto para junho) e no Festival Nacional de Gastronomia (agendado para outubro), que se realizam ambos em Santarém. Estas participações cumprem o objetivo principal da iniciativa da ANMP, que passa pela divulgação e promoção das Cidades do Vinho.

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Um Alentejo único

Voltando ao início: o que é que a Serra d’Ossa tem que mais nenhuma terra de vinhos tem? Entre outros elementos, certamente, há um que sobressai: o terroir. Tendo como elemento comum a Serra d’Ossa, elevação montanhosa conhecida pela riqueza do seu mármore, a região apresenta um caráter e um perfil suficientemente fortes para que os seus vinhos sejam facilmente reconhecíveis, ao mesmo tempo que, de modo aparentemente contraditório, apresenta uma diversidade de tal ordem que se dá ao luxo de incluir duas sub-regiões de vinhos do Alentejo: Borba e Redondo.

Ainda assim, e apesar das diferenças que podem ser notadas de lugar para lugar, o tempero do clima da serra e a constituição dos solos acabam por contribuir profundamente para o perfil dos vinhos da região. Juntamente com o terroir e o clima, há ainda as castas cartacterísticas da região da Serra d’Ossa, onde predominam o Alicante Bouschet, o Aragonez e a Trincadeira, marcando presença em grande parte dos vinhos que tivemos oportunidade provar.

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Na região, embora possamos encontrar alguns exemplos de vinhos monocasta, a tendência é esmagadoramente o blend, como, aliás, manda a boa tradição portuguesa, e também alentejana, de vinificar. Do field blend das vinhas velhas - aqui, encontramos vinhas realmente velhas, não se trata apenas de uma designação com fins promocionais: não é raro encontrar vinhas com mais de 60, 70 e até mesmo 80 anos - aos lotes feitos em adega, a oferta é vasta e a escolha é difícil. O traço que mais sobressai na composição dos vinhos é mesmo a presença maioritária de pelo menos uma das três castas identificadas - quando não mesmo das três em percentagens variáveis.

Entre produtores de larga escala, com ampla presença no mercado nacional e capacidade para exportar em quantidade, e os pequenos produtores, com volumes quase domésticos, e todas as dimensões que existem entre estes dois polos, há uma clara tendência crescente na região: os vinhos biológicos. São cada vez mais os rótulos que exibem a certificação e, mesmo entre aqueles que não a exibem, há já muitas produções a adotar métodos e práticas com vista à produção biológica. O uso de fertilizante orgânico, fazendo da vinha terreno de pasto para gado durante o inverno, e a recusa em controlar as ervas daninhas com recurso a herbicidas, substituindo-os por práticas inofensivas para o ambiente, para os solos e para a vinha, são as práticas mais facilmente observáveis na região da Serra d’Ossa.

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Entre os produtores de vinho que pudemos conhecer, e deixando de parte aqueles que são mais conhecidos e fáceis de encontrar - sem lhes tirar qualquer mérito ou valor, como é evidente (por exemplo, o T Quinta da Terrugem Tinto 2015, do universo Bacalhoa, terá sido um dos melhores vinhos degustados) -, merecem destaque, entre outros, a Casa de Sabicos (que apresentou um impressionante e surpreendente Casa de Sabicos Cabernet Sauvignon & Alfrocheiro), os Courelas da Torre, os Divai da Herdade dos Casarões e ainda alguns tintos Howard’s Folly.

Num nível superior, deixamos duas sugestões que vêm de produtores de dimensões muitíssimo distintas. O Monte de Matacães Tinto 2020 (Aragonez, Touriga Nacional, Alicante Bouschet) é um vinho magnífico, oriundo das vinhas da Herdade da Cardeira, que consagra apenas sete dos seus 400 hectares à produção de vinho - se queremos falar de exclusividade, este é um vinho exclusivo.

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Numa escala de produção muito superior, mas ainda assim num registo muito exclusivo (são pouco mais de 20 hectares de vinha, de onde se extraem cerca de 100 mil garrafas por ano - o número varia de colheita para colheita), encontramos a Quinta do Zambujeiro. Com um cardápio curto, mas muito consistente - apenas cinco rótulos, três tintos e dois brancos -, tem no seu Zambujeiro (Touriga Nacional, Alicante Bouschet e Petit Verdot) o seu título premium. Trata-se de um tinto de excelência, feito para quem gosta de esperar que o vinho atinja o seu zenite. O Zambujeiro é perfeito para uma guarda longa, após a qual estará pronto para revelar as suas principais características: rico e opulento, com grande estrutura tânica, é cremoso na boca, denotando grande equilíbrio.

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Lugares da cidade e da terra

Haverá muito para explorar na região da Serra d’Ossa, pelo que nos permitimos destacar apenas aquilo que tivemos o privilégio de experimentar. Uma visita com prova vínica à Quinta do Zambujeiro, em Rio de Moinhos, concelho de Borba, é, sem dúvida, uma sugestão obrigatória.

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Também em Borba, na Orada, vale a pena visitar e conhecer um pouco mais do Monte de Matacães e a Herdade da Cardeira. Além de o Monte de Matacães se tratar de um lugar idílico, possui um projeto muito interessante de produção biológica, que vai da vinha ao gado - com preservação de raças autóctones, algumas em risco de desaparecerem -, passando pelo olival. Numa era em que o olival intensivo e superintensivo invadem tantas paisagens do Alentejo, é saudar um projeto que tem como filosofia a produção tradicional, protegendo os olivais existentes, com oliveiras espaçadas entre si. O resultado é a produção de um azeite exclusivo e com elevado grau de pureza.

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Em Estremoz, é obrigatória uma visita ao Museu Berardo local. Ali, tudo se desenrola em torno da arte secular da azulejaria, contando a história do seu surgimento, da chegada a Portugal e da evolução do azulejo, uma vez apropriado pelos portugueses. A exposição é muito mais interessante do que qualquer descrição breve possa fazer parecer e tem a particularidade de poder terminar com uma experiência vínica - há várias possibilidades à escolha - com vinhos do universo Bacalhoa, no caso os Quinta do Carmo e o T, da Quinta da Terrugem.

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Para terminar em grande e sem sair de Estremoz, o restaurante Alecrim é uma escolha certeira, exibindo uma magnífica carta de pratos regionais alentejanos e uma ainda mais impressionante coleção de vinhos, capaz de deixar confuso e hesitante o apreciador mais experiente. Quanto a Redondo, Vila Viçosa e Alandroal, não tivemos oportunidade de conhecer, pois esta visita foi demasiado breve. Mas haverá outras oportunidades ao longo do ano para, acompanhando a Cidade do Vinho 2025, desbravar e explorar os encantos de cada lugar.

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