Há quem lhe chame loucura, outros falam em coragem, mas para a maioria trata-se apenas de um desafio, que porventura necessitará de uma pitada tanto de uma como de outra. Afinal, atravessar a pé o Algarve pelos trilhos do interior, ao longo de 300 km, não é algo ao alcance de todos, mas é isso mesmo que cerca de 100 atletas vão voltar a fazer, na quinta edição da maior prova de corrida realizada em Portugal. "É acima de tudo uma prova de superação, em que a força mental é tão ou mais importante que a física", alerta Bruno Rodrigues, o organizador da prova, cujo objetivo, desde a primeira hora, sempre foi "o de promover a zona esquecida e desconhecida da região mais turística do país". E o conceito não podia ser mais simples, cruzar o Algarve de lés-a-lés, sempre pelo interior.
A ideia de fazer uma prova de trail running na Via Algarviana, a grande rota pedestre, com cerca de 300 km, que liga o Cabo de São Vicente, no extremo sudoeste da península, à vila de Alcoutim, junto à fronteira com Espanha, cresceu, literalmente, passo a passo. "Comecei a correr em trilhos em 2013 e à medida que ia aumentando as distâncias ficava cada vez com mais vontade de percorrer a Via Algarviana em toda a sua extensão", lembra Bruno. O sonho de ali realizar uma prova de nível internacional concretizou-se finalmente em 2017, com a primeira edição da Algarviana Ultra Trail, (ALUT), organizada pela associação Algarve Trail Running, a entidade ainda hoje responsável pela prova. "Queríamos dar a conhecer esse outro Algarve, aproveitando uma infraestrutura já existente, a Via Algarviana, para criar um evento que unisse desporto, turismo e cultura, de forma a dinamizar o interior da região, dando a conhecer toda a sua beleza natural e riqueza cultural, mas também para combater a sazonalidade e a desertificação", defende.
A exemplo das edições anteriores, o percurso do ALUT, que tem início no Cabo de São Vicente, em Sagres, desenvolve-se assim e maioritariamente ao longo da Via Algarviana, numa distância aproximada de 300 km e um desnível positivo de cerca de sete mil metros, que deverão ser concluídos num tempo limite de 72 horas, geridas pelos atletas como bem entenderem. Ao longo do percurso existem 11 bases de vida, com comida e bebida, cuidados médicos e até zonas de descanso, onde podem dormir uma pequena sesta antes de seguir caminho.
O percurso pode ser percorrido a solo ou por equipas com um máximo de 4 membros. Neste caso o trajeto é dividido em quatro etapas, com uma média de 75 km cada e horas de partida previamente definidas, algumas à noite e de madrugada. A vantagem é que os restantes membros da equipa podem usar o longo tempo de prova dos colegas para fazer algum turismo. E não falta mesmo o que ver e fazer, pois o ALUT atravessa um total de 13 municípios, parte do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, as três principais serras algarvias (Caldeirão, Monchique e Espinhaço de Cão) e a zona do barrocal. Em suma, o Alut não é uma corrida, é uma viagem. Uma viagem interior - pelo interior que, como gosta de sublinhar Bruno, "não se explica, sente-se".
Um roteiro de paisagens imperdíveis ao longo da Via Algarviana
Ao longo dos 300 quilómetros desta prova podem ser apreciados e visitados diversos locais, parte deles desconhecidos da maioria dos veraneantes que fazem do Algarve o seu destino de férias. Por causa disso, a organização sugere a quem vier acompanhar a prova um roteiro de quatro dias pelo interior, que inclui locais como o Forte de Beliche, ponto de partida da prova, a Mata de Barão de São João, uma das maiores manchas verdes do concelho de Lagos, o Miradouro da Picota, num dos pontos mais elevados do Algarve, junto a Monchique, onde fica também a Fonte Santa, junto à ribeira com o mesmo nome da vila. A Barragem do Funcho, no interior do concelho de Silves, onde é também obrigatória uma visita ao Castelo desta antiga capital do reino do Algarve, outrora conhecida como a "Bagdade do Ocidente". Mais para dentro, aconselha-se uma paragem na vila de Alte, uma das mais típicas do barrocal, já no concelho de Loulé, antes de avançar serra adentro, com nova pausa nas aldeias serranas de Barranco do Velho e Cachopo. Já com a meta quase à vista, novo desvio se impõem, para apreciar a paisagem ribeirinha da Ribeira da Foupana, uma das maiores e mais preservadas do Algarve, que nasce na serra do Caldeirão para depois desaguar na Ribeira de Odeleite, pouco antes desta se juntar ao Guadiana. E claro, Alcoutim, a bela vila ribeirinha ao Guadiana, onde esta aventura termina em grande beleza.