Centro
Alcobaça, terra de amores impossíveis
Segundo uma lenda, Alcobaça chama-se assim devido a dois amantes desavindos, Alcoa e Baça, que em tempos imemoriais ali terão chorado um pelo outro. Com as lágrimas terão formado os rios, com os seus nomes, que se juntam ali, nas traseiras do enorme mosteiro, num local coerentemente batizado de Jardim do Amor. Nos muros, existem centenas de pequenos cofres, onde os amantes de hoje podem deixar juras de amor eterno num pequeno papiro, que pode ser adquirido no comércio local, em conjunto com duas chaves. Foi devido à abundância da água que em 1153, por ordem do rei D. Afonso Henriques, aqui foi edificada, junto ao local de confluência dos dois rios, a Abadia de Santa Maria de Alcobaça. À época um dos maiores mosteiros cistercienses da Europa, é considerado "o primeiro ensaio de arquitetura gótica em Portugal", que impressiona não só pela escala e monumentalidade, mas também pelas linhas "límpidas e austeras". Entre as dependências medievais destacam-se espaços como a Sala do Capítulo, o Refeitório, a Sala dos Monges e o Dormitório, todos edificados entre os séculos XIII e XIV. O Mosteiro de Alcobaça foi também um dos primeiros panteões reais em Portugal. Além dos túmulos de D. Afonso II (1185-1223) e D. Afonso III (1210-1279), inclui também o D. Pedro I (1320-1367), que se encontra situado num dos lados do transepto, mesmo em frente ao da amada Inês de Castro (1320-1355), assassinada a mando do rei D. Afonso IV, o pai do então príncipe Pedro. Quando este subiu ao trono, coroou postumamente D. Inês como rainha de Portugal. Os túmulos encontram-se frente a frente, para que, de acordo com outra lenda, o casal se olhasse nos olhos quando ressuscitasse no dia do Juízo Final. A história merece, portanto, uma visita a Alcobaça.
Tomar, imaginário Templário
Há dois modos de se chegar a um sítio, pelo caminho mais rápido ou indo simplesmente à descoberta, fazendo desvios quando estes se impõem e assim ir ter a locais como a Pia do Urso, uma aldeia situada a meio caminho entre Batalha e Fátima, onde foi instalado um parque temático e sensorial adaptado a invisuais, acompanhado de um circuito pedestre com vista para uma paisagem deslumbrante. Ao longo do percurso, podem ser apreciadas algumas curiosas formações geológicas, conhecidas localmente como "pias", onde, segundo a crença popular, os ursos, entretanto já há muito extintos, iam beber água. Hoje bastante isolada, a pequena localidade fica situada na encruzilhada de diversas vias romanas e por aqui passou, em 1385, o exército português liderado por D. Nuno Álvares Pereira, a caminho do campo de batalha de Aljubarrota.
Em sentido contrário, chega-se a Ourém e um pouco mais além a Tomar, onde fica o famoso Convento de Cristo e Castelo dos Templários, um dos maiores conjuntos monumentais da arquitetura peninsular e europeia, não só pela extensão, mas essencialmente pela duração temporal da sua construção, que se prolonga desde os primórdios da fundação da nacionalidade, no século XII, até ao dealbar do Portugal moderno, com o Liberalismo do século XIX. Um dos locais mais emblemáticos deste enorme edificado é a "Charola dos templários", um dos raros templos em rotunda da Europa medieval, que teve como modelo a basílica do Santo Sepulcro, em Jerusalém. Igualmente emblemática é a janela da Casa do Capítulo, porventura a imagem mais conhecida do Convento de Cristo, em estilo manuelino, tal como o Claustro Principal, mandado construir por D. João III e considerado uma obra-prima da arquitetura renascentista europeia.
Nazaré, em busca da onda gigante
É uma das paisagens mais conhecidas do litoral português, aquele impressionante promontório, com vista panorâmica sobre a Nazaré, o oceano e toda a linha de costa. São mais de 300 metros a pique, coroados, no seu topo, pela pequena Capela da Memória, onde, segundo a lenda, o cavalo de D. Fuas Roupinho, terá estancado as patas, evitando que o amigo e companheiro de armas de D. Afonso Henriques despencasse pelo precipício quando ia em perseguição de um veado. Diz o povo que o sinal deixado na rocha pela ferradura, nessa enevoada manhã de 1182, ainda lá está, cravado no Miradouro do Suberco. Desde então lugar de grande devoção, o Sítio da Nazaré continua a atrair multidões. A maioria, porém, já não vem para rezar no Santuário da Senhora da Nazaré, por onde passaram Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral, antes de se fazerem ao mar, mas sim para ver as ondas gigantes que nos últimos anos deram uma fama planetária à vila. A culpa foi de Garret McNamara, o surfista havaiano que em 2012 aqui cavalgou a maior onda até então surfada. Desde então, o surfista americano, que todos aos anos regressa à Nazaré, passou a ser tratado como um verdadeiro filho da terra, e a praia do Norte tornou-se procurada por surfistas do mundo inteiro.
Intacta permanece a tradição piscatória da vila, como se comprova nos velhos barcos de arte xávega, ainda hoje praticada ou no peixe a secar no areal, vendido ali mesmo, em toscas bancas de madeira por senhoras vestidas com as tradicionais sete saias. "Isto é uma tradição antiga, do tempo em que ainda não havia frigoríficos e tinha de se conservar o peixe", explicam a quem passa, dando-lhes a provar alguns nacos de carapau seco. Pode ser comido assim mesmo, mas também confecionado de diversas formas: "cozido, grelhado, de cebolada, em tomatada ou até à Braz" porque, afinal, como diz a velha senhora, "toda a gente gosta deste peixinho".
Foz do Arelho, passadiços com vista para o Atlântico
É também conhecida como Atlântica, a via que faz a ligação entre Salir do Porto e a Foz do Arelho. A estrada termina no topo da falésia, mesmo junto aos famosos passadiços criados pela arquiteta paisagista Nádia Schilling, que desde a sua inauguração, em 2016, se tornaram num ponto de paragem (e de passeio) obrigatório para quem passa por aqui. No total são cerca de 800 metros de passadiços, que se entrelaçam, a diversas alturas, ao longo da falésia, apenas com o único objetivo de deixar contemplar o mar. Ao longo do percurso, há diversos miradouros, bancos e varandas, locais para se estar em grupo e outros para ficar só, num original projeto que foi selecionado para integrar o Atlas of World Landscape Architecture, publicado pela Braun, uma editora suíça especializada em livros de arquitetura. Mais abaixo, a praia da Foz do Arelho permanece igual ao que sempre foi. Com um largo areal ladeado por uma marginal, é banhada de um lado pelo mar e do outro pelas águas bem mais calmas da Lagoa de Óbidos. Ao longo das margens do imenso espelho de água, revelam-se locais como o parque de merendas do Arelho, junto à foz do rio com o mesmo nome, de onde sai um percurso pedonal que conduz a uma torre de observação de aves; ou a aprazível praia fluvial do Covão dos Muzaranhos, na qual ainda podem ser vistas algumas bateiras, os tradicionais barcos usados pelos pescadores da lagoa.
Norte
Aveiro, o labirinto da Ria
Apesar de abundância de água e da proximidade do oceano, o concelho de Aveiro apenas dispõe de uma única praia, mas que vale por muitas. Fica na zona conhecida como São Jacinto, um verdadeiro paraíso natural situado entre a Reserva Natural das Dunas de São Jacinto, a Ria de Aveiro e o Oceano Atlântico. Ao todo são mais de 600 hectares, classificados como área protegida, que separam o mar da ria, numa paisagem em estado de conservação único. Dista apenas 12 quilómetros da cidade em percurso fluvial (há carreiras regulares de ferry), mas a quase meia centena por estrada, sendo necessário, para lá chegar, percorrer todo o istmo que se estende desde a Torreira, a norte. Bem mais acessíveis, mas igualmente deslumbrantes são os passadiços que cruzam a ria de Aveiro desde o cais da Ribeira de Esgueira, a cerca de dois quilómetros do centro da cidade. São sete quilómetros (ou o dobro, em caso de ida e volta) de passeio por uma paisagem constantemente em mudança, consoante a hora do dia e se a maré está alta ou baixa. Pode-se caminhar, correr, pedalar e até descansar, nos inúmeros bancos dispostos ao longo do percurso, sempre sobre a água, nos quais são reveladas algumas curiosidades, dizeres e costumes locais. Do outro lado da ria, já em direção a Ílhavo, impõem-se também um desvio para visitar as salinas, apreciando o mosaico de marinhas onde é produzido o afamado sal de Aveiro. Um dos melhores locais para apreciar este singular território é o novo Centro Municipal de Interpretação Ambiental, situado no lugar do Moinho, mesmo em frente à marinha da Troncalhada, uma das mais visitadas da cidade, onde, além de diversa informação, o visitante pode apreciar uma vista panorâmica sobre a ria e as salinas, a partir do terraço do moderno edifício.
Costa Nova, a Biarritz portuguesa
Antes de chegar a Ílhavo, impõem-se um curto desvio no sentido contrário ao do mar, para visitar o Museu da Vista Alegre, situado nas instalações da antiga fábrica de porcelanas, onde estão expostas mais de 30 mil peças. O complexo, construído entre o início do século XIX e a segunda metade do século XX, inclui diversos espaços museológicos, como a capela, o antigo palácio, as oficinas ou a creche, e engloba hoje também um restaurante, cafetaria, hotel e diversas lojas, entre as quais um outlet da marca, onde podem ser adquiridas algumas peças a verdadeiro preço de saldo. Outrora um dos centros nevrálgicos da faina do bacalhau, eram de Ílhavo a maioria dos capitães e pescadores que faziam as companhas de longo curso nos mares do norte. A memória desses tempos está hoje bem preservada no Museu Marítimo de Ílhavo, que além do edifício principal, conta também com o único navio sobrevivente da frota portuguesa do bacalhau. O Navio-Museu Santo André está ancorado junto ao Jardim Oudinot e é uma das grandes atrações da cidade da Gafanha-da-Nazaré. Para sul, ficam as praias da Costa Nova, Vagueira e Mira, às quais se acede através da Estrada Florestal – há outros caminhos, mas nenhum é tão bonito como este. Banhada pelas calmas águas da ria de um lado e pelas ondas revoltas do Atlântico do outro, a Costa Nova é outro local de visita obrigatória, devido aos "palheiros", as tradicionais casas de madeira às riscas brancas, alternadas com outras cores como vermelho, azul, verde ou amarelo – um estilo que se mantém ainda nas modernas moradias de férias e valeu a esta pequena localidade do concelho de ílhavo a alcunha de "Biarritz Portuguesa", cujo imenso areal, acompanhado por um enorme passadiço, se estende vários quilómetros para sul, até à Vagueira, convidando a longas caminhadas à beira-mar.
Arcos de Valdevez, porta de entrada para o Parque Nacional
Se é natureza que se procura, nada como rumar até ao concelho de Arcos de Valdevez, para conhecer a Porta do Mezio, uma das entradas oficias do Parque Nacional da Peneda-Gerês. À sua volta partem vários percursos pedestres (ou também cicláveis, como é o caso da Ecovia do Ermelo, mesmo junto ao Lima), que dão a conhecer não só a paisagem, mas também alguns exemplos da singular relação entre homem e natureza nesta região, como as "brandas" e as "inverneiras". As primeiras são um espaço sazonal no alto da montanha, usado como zona de pastoreio durante o tempo mais quente, enquanto as segundas ficam a quotas mais baixas e servem também para cultivo. Ainda hoje continuam a ser usadas e geridas em comunidade, como acontece com a branda do Poulo da Seida, junto à qual pastam algumas vacas cachenas, a raça autóctone da região, e um ou outro cavalo selvagem. Fica situada num prado, em pleno topo da montanha, onde o visitante é surpreendido por uma autêntica aldeia de "cortelhos", os rudes abrigos dos pastores, construídos em pedra sobreposta, que remetem quem aqui chega para um tempo cada vez mais distante. O Centro Interpretativo inclui ainda um parque escultórico com as mais emblemáticas espécies animais da região, canteiros com flora do parque, um museu com o espólio das escavações do Núcleo Megalítico do Mezio e uma zona de lazer com piscina, circuito de manutenção e ginásio ao ar livre. E, em breve, haverá também uma nova ala, dedicada aos cavalos garranos e um Parque Biológico, com aninais autóctones que já não possam ser devolvidos à natureza. O espaço fica situado a poucos quilómetros da histórica vila do Soajo, conhecida pelo seu monumental conjunto de espigueiros centenários e também ela merecedora de visita demorada.
Paredes de Coura, além do festival
Poucos o saberão, mas a pouco menos de oito quilómetros do centro da vila de Paredes de Coura, num planalto no topo da serra, fica um dos mais pitorescos exemplos do modernismo português tentado implementar pelo Estado Novo, algures entre as décadas de 40 e 50. A antiga colónia agrícola de Vascões nunca chegou a ser o 'kibutz' à portuguesa que Salazar pretendia, mas ainda hoje continua a marcar a paisagem a e memória coletiva da região. Foram na altura construídas 15 casas geminadas, com dois pisos, terreno para cultivo e mordomias como garagens, casas de banho ou cozinhas com água canalizada, além de um sistema de combate a fogos e de rega dos campos. Todo um luxo, quando se tem em conta a realidade da região à época, a que se acrescentavam uma escola primária e a casa do professor – com a extinção definitiva da colónia, em 1998, estes equipamentos deram lugar a um moderno Centro de Educação e Interpretação Ambiental, aberto desde 2007 e de onde parte um curioso percurso pedestre, com pouco mais de oito km, que recria, à escala, o sistema solar.
Fica ali bem perto, uma das nascentes do Coura, aqui pouco mais que um regato, passando quase despercebido entre a frondosa vegetação da Paisagem Protegida do Corno do Bico, uma das maiores manchas de Carvalho Português, situada a mais de 800 metros de altitude. Ao cenário, que mais parece saído de um conto de fadas, com o bucólico verde dos musgos e um sem fim de líquenes a aguentarem-se até no pino do verão, não falta sequer uma alcateia de lobos.