Um restaurante, quatro cozinhas. É com base nesta premissa que se ergue o Mercado da Vila, situado no secular mercado do peixe em Vila Franca do Campo, na Ilha de São Miguel, Açores, recentemente restaurado. Um lugar onde a experiência gastronómica reúne chefes de diferentes especialidades, várias culturas e anos de know-how.
A cozinha italiana está a cargo do siciliano Roberto Mezzapelle, Campeão do Mundo de Pizza em 2002, enquanto a cozinha moderna é da autoria de Rui Paula, vencedor de duas estrelas Michelin. Já Donária Pacheco, chef de cozinha do restaurante Botequim Açoriano, uma referência na restauração nos Açores, encarrega-se das iguarias regionais, enquanto Paulo Morais, um dos primeiros chefs especialitas em sushi em Portugal, é quem toma as decisões no que toca à gastronomia oriental. Rúben Pacheco Correia, autor gastronómico, filho de Donária Pacheco e mente por trás do Botequim Açoriano e agora do Mercado da Vila, explicou à MUST como tudo aconteceu.
O Mercado da Vila é recente, abriu a 26 de novembro de 2022. Como lhe surgiu esta premissa?
A ideia foi minha, claro que muito inspirado por aquilo que já se faz de bem em grandes cidades europeias, onde incluo, obviamente, Lisboa. Aprecio bastante Mercados, aliás quando viajo, seja para onde for, uma das primeiras visitas que faço é ao mercado local. O mercado é a montra da cultura e da civilização de cada um dos povos. É onde encontramos os seus hábitos alimentares, a forma como socializam uns com os outros. Brillat-Savarin dizia "diz-me o que comes e dir-te-ei quem és".
Esta moda mais recente de requalificar antigos mercados para mercados gastronómicos, com ofertas diferenciadas em termos de cozinhas, fascinou-me desde o primeiro dia em que tive contacto com o Mercado da Ribeira, em Lisboa, por exemplo. Pensei logo que gostaria de fazer na minha terra um conceito do género, mas mais personalizado, com serviço de mesa, sem que os nossos clientes tivessem a necessidade de se levantarem a meio da sua refeição para ir buscar mais um prato ou uma bebida. E assim surgiu o Mercado da Vila. É um Mercado com quatro cozinhas, quatro chefes, quatro restaurantes diferentes - digamos - mas onde não precisamos de sair da mesa para podermos ter uma experiência completa de todas estas cozinhas. Um upgrade àquilo que já havia de bom no nosso país.
Porquê estas especialidades?
O objetivo era termos cozinhas diferentes para a ilha. O Paulo Morais garantiu-nos, por exemplo, trazer uma cozinha japonesa mais tradicional para a ilha. Uma oferta de sushi mais clássico, sem fusões, respeitando apenas a frescura do peixe que tanto caracteriza os nossos Açores. O Rui Paula, chef de cozinha de autor, pega em pratos da sua infância - cozinha portuguesa, transmontana - e apresenta-os de uma forma inovadora como o caracteriza. O Roberto Mezzapelle garantiu uma cozinha italiana genuína para a ilha, muito focado na gastronomia siciliana. É o melhor pizzaolo que conheço em Portugal. E a minha mãe, Donária Pacheco, completa o mercado com o ponto de partida da viagem de sabores que pretendemos proporcionar: a gastronomia açoriana. Não é por ser minha mãe, mas é de facto uma das chefes que marca a diferença nos Açores com a nossa gastronomia.
Como foi o processo de escolher a equipa de chefs?
Foi muito fácil, já éramos todos amigos. Aliás, alguns deles já tinham vindo cozinhar ao meu outro restaurante com a minha mãe, o Botequim Açoriano, em Rabo de Peixe. O Paulo Morais, por exemplo. Quando pensei no conceito do Mercado pensei imediatamente nestes nomes e creio que conseguimos reunir aqui um bom grupo de amigos que se diverte a criar coisas diferentes para a ilha e a fazer tantas outras pessoas felizes. É o nosso objetivo.
O restaurante fica num antigo mercado, conhecido há mais de cem anos por Barracão de Peixe. Há algum motivo para terem escolhido esta localização?
Este era um espaço que estava disponível a concurso na Câmara e como é um edifício que se enquadrava perfeitamente no nosso modelo de Mercado - o espaço também fisicamente teria de parecer um Mercado, tal como parecesse - foi ouro sobre azul. A Câmara Municipal de Vila Franca do Campo fez um trabalho na requalificação deste imóvel que estava ao abandono há mais de trinta anos e nós, modéstia à parte, fizemos o resto. Estamos a trazer uma dinâmica diferente à restauração desta que foi a primeira capital dos Açores.