Para muitos Glashütte, na Alemanha, é a nova casa da Alta Relojoaria. Já não é a Suíça. Trata-se obviamente de uma afirmação muitíssimo controversa, mas pelo menos tem uma justificação - e a justificação um nome: A. Lange & Söhne, uma marca de relógios absolutamente superlativa. Cada Lange - vamos chamar-lhe assim, (ou ALS, a bem da facilidade de escrita e leitura) é o resultado de um extremo cuidado na manufatura e de uma enorme ambição técnica. É o relógio de uma vida, sobretudo se estivermos a falar de uma destas três edições especiais, comemorativas do 175º aniversário. Temos então um relógio ultra elegante, a perfeição na simplicidade, um cronógrafo ratrapante, entre o clássico e o desportivo, e finalmente uma montra de mestria, com algumas das complicações mais exigentes da relojoaria mecânica. Todos em edição limitada, todos em ouro mel, ou Honeygold, a liga que a Lange inventou, um ouro de 18 quilates muito mais resistente ao choque e aos riscos.
Na cidade, esse hub saxónico, existem outras marcas de relógios, notavelmente a Glashütte Original, ou a Nomos e a Tutima, mas a Lange é o pináculo dessa sabedoria e foi, ainda por cima, onde tudo começou…
Corria o ano de 1845, quando um tal de Ferdinand Adolf Lange, relojoeiro de Dresden, chegou à cidade para aí montar o seu atelier e fabricar relógios de bolso. Três anos depois era eleito Prefeito da cidade. O negócio prosperava, alicerçado numa reputação de excelência, e várias outras marcas foram surgindo à sua volta. O boom durou mais ou menos até ao fim da Segunda Guerra Mundial, quando as fábricas foram bombardeadas e a cidade, bem perto da fronteira com a República Checa, acabou por ficar no sector de influência soviética. Não tardou muito até que os Lange - o negócio tinha permanecido sob controlo familiar (daí o & Sohne, ou & Filhos) - foram forçados a abandonar a cidade e a ALS transformada numa fábrica que produzia relógios baratos, mas não necessariamente bons. Ou pelo menos, nada que se assemelhasse à anterior filosofia.
Walter Lange tinha vinte e mutos anos então, e nunca desistiu do sonho de recuperar a fábrica do bisavô. Quando a oportunidade surgiu, após a reunificação, tinha 66 anos já, uma reputação sólida no mundo da relojoaria, mas pouco mais. Como referiu algum tempo depois, "Não tínhamos relógios para construir e vender, não tínhamos empregados, edifício ou máquinas. A única coisa que tínhamos era a visão de voltar a criar os melhores relógios do mundo em Glashütte." O sonho (re)começou pequeno – quatro modelos, quatro anos depois –, mas ambicioso, com movimentos mecânicos complexos e um nível de detalhe e precisão apenas à altura das melhores casas suíças. Alicerçado na mesma reputação do bisavô, o sucesso não tardou e hoje são mais de 800 colaboradores e um pé em quase todos os países. Incluindo Portugal, onde até já existiu a única boutique da marca na península ibérica, e é hoje representada pela Torres Joalheiros.
Mas vamos então explorar um pouco melhor os três novos modelos, que surgem como fazendo parte da coleção 1815, o que parece justo, pois esse é o ano de nascimento de F.A. Lange e o design inspira-se especialmente nos tais relógios de bolso que lhe granjearam a fama. Como vimos, também, os três partilham a caixa em Honeygold, o ouro que a Lange inventou para celebrar os seus 165 anos. Surgiu assim em três modelos, como agora, mas entre uns e outros só apareceu em mais dois modelos, e daqui se percebe como o reservam mesmo só para as ocasiões especiais.
1815 Thin Honeygold ‘Homage to F. A. Lange’
O mais simples dos três, é pura elegância no pulso. O mostrador em branco, minimalista, está construído em duas camadas, o que lhe confere uma multidimensionalidade muito interessante. A bracelete é em pele castanho escuro e a caixa em Honeygold, com 38 mm e apenas 6,3 mm de espessura. O movimento é de corda manual e é de notar que não existe nem data nem ponteiros de segundos, para não atrapalhar a beleza. Está limitado a 175 peças (perceberam!?), mas custa mais de 30 mil euros.
1815 Rattrapante Honeygold ‘Homage to F. A. Lange’
Desta vez o mostrador é negro, com acentos no mesmo ouro da caixa, mantendo uma evidente elegância, apesar do caráter desportivo da complicação. Trata-se de um movimento totalmente novo e "apenas" o sexto cronógrafo split seconds da ALS. De notar ainda o "jogo" nos ponteiros, com o ponteiro central do cronógrafo em ouro vermelho e o do ratrapante em aço rodionizado. Os das horas, minutos e pequenos segundos são em ouro clássico e o ponteiro do contador de 30 minutos em ouro branco. Edição limitada a 100 unidades, e pode somar mais 100 mil euros ao preço do relógio anterior.
Tourbograph Perpetual Honeygold
A completar o trio de homenagem a F. A. Lange, temos um dos relógios mais complicados a sair da ALS. Só o calibre L133.1 tem 684 peças e algumas das complicações mais difíceis de realizar: um mecanismo de fuso-corrente, que assegura a suave transferência de tensão/torque, um turbilhão, um cronógrafo ratrapante e um calendário perpétuo com fases da lua, precisas para os próximos 122 anos (e seis meses). Desta vez o ouro mel não está apenas na caixa, mas no próprio mostrador que merecia também figurar entre as complicações, dada a complexidade da realização (só para o montar requer 2 relojoeiros). O Tourbograph está limitado a 50 relógios e custa meio milhão de euros.