Podemos argumentar que um bom relógio mecânico, construído para durar uma vida, é uma aposta mais saudável para o planeta do que uma alternativa cheia de microchips e baterias, que vai rapidamente ficar obsoleta. Sobretudo quando se constroem e vendem aos milhões, como no caso do Apple Watch que, em apenas seis meses, vende mais do que toda a indústria suíça num ano.
Mas mesmo estes modelos tradicionais consomem recursos, centenas de peças em aço, titânio, ouro, e outros materiais preciosos ou pesados que preocupam vários entusiastas da relojoaria. As questões de sustentabilidade saltaram para o topo da lista dos fatores decisivos na hora de escolher um novo modelo e isto levou evidentemente a que o tema se tornasse omnipresente no discurso de muitas marcas. Em muitos casos com melhores intenções do que propriamente ações, mas noutras as mudanças tiveram realmente um impacto positivo. Aqui reunimos um conjunto desses relógios, em que o verde é mais do que uma cor, é um estado de espírito.
Oris
Em 2021, a Oris tornou-se climaticamente neutra. Não foi uma promessa, nem um objetivo, mas uma realidade − e desde então tem procurado reduzir ainda mais as suas emissões e aumentar o impacto positivo no planeta. O site da marca permite-nos acompanhar as iniciativas que a Oris organiza ou apoia em todo o mundo, e que já chegaram a Portugal, como no passado dia 17 de setembro, com uma limpeza de plásticos na Praia de São Lourenço, na Ericeira.
Têm também criado algumas edições especiais, cujos resultados servem para ajudar e proteger áreas ou espécies ameaçadas. É neste contexto que surge a parceria com a Bracenet, uma empresa alemã que nasceu com o propósito de recuperar as redes de pesca perdidas no mar.
A Bracenet já recuperou perto de 800 toneladas de redes, que são depois aproveitadas para criar pulseiras, porta-chaves e outros acessórios que, por sua vez, ajudam a financiar a operação e ainda apoiar ONGs como a Healthy Seas ou a Sea Shepherd. Outra iniciativa interessante é a associação ao mundo do futebol, com a criação das redes de baliza. Já firmaram uma parceria com o Werder Bremen, que pretendem alargar ao resto da Bundesliga e da liga francesa (para já). Neste último caso contam também com a influência da Oris, que é uma das parceiras oficiais da Ligue1.
Quanto ao relógio, trata-se de um Oris Aquis automático, com data e movimento 733, que tem por base o Selita SW 200-1. Está disponível em 43,50 mm e 36,50 mm, e as redes foram aproveitadas de forma surpreendente no mostrador do relógio. O processo implica aquecer suavemente pequenos pedaços verdes, azuis e brancos até se fundirem com a matéria-prima. Ao arrefecerem, endurecem e formam uma fina folha de 0,3 mm com um look caleidoscópico. Serve para aproveitar as "sobras" das pulseiras, mas, evidentemente, "gasta" muito pouco plástico. As marcas sabem-no bem, mas o objetivo da parceria é continuar a alertar para o problema, porque a única hipótese de salvar os oceanos será mesmo com uma mudança de mentalidades.
Cédric Bellon
Está desculpado se nunca ouviu falar na Cédric Bellon. Mesmo sendo um entusiasta por relojoaria. A marca foi lançada em 2020, na plataforma de crowdfunding Watch Angels, e desde então lançou pouquíssimos modelos no mercado, sendo que há uma boa explicação para isso…
Belllon é um designer de relógios que trabalhou para marcas como a Tag Heuer ou Bell & Ross, até decidir lançar-se por sua própria conta, precisamente porque queria criar os relógios mais sustentáveis – e cada modelo vem acompanhado do seu relatório de sustentabilidade. Mas o que "atrasa" a produção, digamos assim, é a decisão de não utilizar movimentos novos, mas recuperados. Não se trata de movimentos em segunda mão, antes peças encontradas em velhos stocks, porque é evidentemente melhor para o planeta aproveitar algo já feito do que construir novo. O filão têm sido os calibres DD14060 da Dubois Depraz, e P024 da Soprod, ambos automáticos e com segundo fuso horário. E o aço é 100% reciclado.
Panerai
A Panerai tem vindo a desenvolver ou a apoiar diversas iniciativas em defesa dos oceanos, sendo a mais importante, sem dúvida, a parceria com a Missão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO, que pretende implementar um programa de alfabetização oceânica à escala global até ao final da década. Trata-se de um projeto gigantesco que se estende também aos relógios, como refere o CEO, Jean-Marc Pontroué: "Fomos a primeira marca a apresentar uma abordagem sustentável não limitada a pulseiras ou embalagens e a primeira a criar um relógio feito com 98% de materiais reciclados". Refere-se ao eLAB-ID, que na verdade tem 98,6% de materiais reciclados. Até o vidro de safira e o brilho nos ponteiros o são, através de um processo que implicou um esforço enorme também por parte dos fornecedores. Sem surpresas, no entanto, o eLAB-ID é um relógio quase conceptual, uma série limitada a 30 peças. Por isso a simples mudança para o eSteel, um composto feito predominantemente por aço reciclado (95%) acabará por ter um impacto maior.
Cada caixa é trabalhada à mão para conseguir um efeito usado, reminiscente dos Radiomir originais, desenhados para a marinha italiana no início do século passado. E, tal como o nome indica, o movimento P5000, de corda manual, oferece essa incrível reserva de marcha de oito dias.
Blancpain
A Blancpain ajudou a lançar a moda do mergulho subaquático com o lançamento do Fifty Fathoms, na primeira metade dos anos 1950. O mais interessante é que praticamente desde então a marca suíça tem estado envolvida em projetos de conservação marítima − muito antes de isso ser uma causa. Entre as iniciativas atuais, podemos contar com os projetos Pristine Seas, da National Geographic, e o Gombessa Expeditions.
Lançado para celebrar não apenas os 70 anos do FF original, mas também os 10 anos do lançamento do projeto Gombessa. Trata-se de um relógio capaz de medir, pela primeira vez, mergulhos de 2H30. Um pedido dos mergulhadores envolvidos no projeto, e que passam longos períodos debaixo de água, a estudar algumas das espécies mais raras do mundo.
IWC
Em 2018, a World Wide Fund for Nature (WWF) lançou um relatório sobre sustentabilidade no setor da joalharia e relojoaria de luxo, encontrando muito poucos pontos positivos a destacar. Embora o relatório fosse relativamente restrito no número de marcas (15), só houve elogios para a IWC, com um percurso rumo à sustentabilidade considerado "ambicioso" pela organização. Já este ano, a delegação suíça da WWF regressou ao tema, analisando mais empresas e descobrindo que existem "cada vez mais marcas de luxo a trabalhar com modelos de negócio circulares, procurando obter e fabricar materiais e produtos ambientalmente sustentáveis". Mas adivinhem quem continuava no topo da tabela de relojoaria? A IWC tem todo um separador dedicado às iniciativas, ações e claims de sustentabilidade que pratica, e que vale a pena espreitar.
Seiko
Há muitos anos que a gigante japonesa se associou à PADI, a maior organização de mergulho a nível mundial, e é a principal financiadora do PADI Marine Debris, um programa de ciência cidadã que promove a limpeza do lixo marinho e criou o maior e mais detalhado mapa dos locais em risco. Paralelamente, a Seiko criou a linha Save the Ocean, com modelos inspirados nos seus relógios de mergulho das décadas de 1960 e 1970, e cujas vendas servem precisamente para financiar esta e outras iniciativas.