A velhice, diz-se, começa a instalar-se quando deixamos de andar como quem tem um propósito, um dever para cumprir, um sítio para estar, e começamos a andar muito devagar, hesitando e contemplando, como quem tem todo o tempo do mundo, firmemente plantados no meio do passeio e ocupando três quartos do espaço disponível, para frustração e horror de quem tenta ultrapassar-nos. É o princípio do fim. Se não da vida da pessoa idosa, certamente da paciência dos seus parentes mais jovens, que têm coisas para fazer e já não conseguem abrandar mais o passo sem tropeçar nos próprios pés. Contrariamente ao que seria de supor, quanto mais velho se fica, menos pressa se tem. Mas há esperança. Um estudo recente sobre a ligação entre fazer caminhadas em passo rápido e a saúde do ritmo cardíaco pode ser a motivação que faltava para andarmos todos mais a pé e mais depressa.
A investigação, publicada no jornal médico online BMJ Heart, analisou dados de 420.925 participantes do UK Biobank que forneceram informações sobre a sua velocidade ao caminhar. O UK Biobank é um dos maiores e mais importantes projetos de investigação biomédica do mundo, que reúne informações detalhadas sobre a saúde, estilo de vida, genética e imagens médicas de meio milhão de voluntários britânicos, com idades entre 40 e 69 anos no momento da inscrição (entre 2006 e 2010). Do total de pessoas analisadas, 81.956 forneceram dados mais detalhados sobre o tempo que passavam a caminhar e a que ritmos o faziam a cada momento. E foi com base nesses detalhes que foi possível chegar a estas conclusões.
Segundo o estudo, um ritmo lento foi definido como inferior a 4,8 km/h; ritmo moderado entre 4,8 e 6,4 km/h; e ritmo acelerado como superior a 6,4 km/h. Dos participantes cujos dados foram recolhidos para o estudo, 6,5% caminhavam lentamente, 53%, a maioria, faziam-no a um ritmo médio, e 41% a um ritmo rápido.
Depois de terem tido em conta fatores demográficos e de estilo de vida – incluindo o facto de os participantes que caminhavam mais depressa serem mais frequentemente homens, viverem em zonas menos desfavorecidas e terem estilos de vida mais saudáveis –, os investigadores verificaram que caminhar a um ritmo médio ou acelerado estava associado, respetivamente, a uma redução de 35% e 43% do risco de qualquer tipo de arritmia cardíaca, comparativamente com caminhar a um ritmo lento. Uma conclusão importante tendo em conta que, acompanhando estas pessoas durante uma média de 13 anos, foi possível observar que 36.574 participantes (9%) desenvolveram algum tipo de anomalia do ritmo cardíaco. Embora o tempo despendido a caminhar lentamente não tenha sido associado a um risco aumentado de desenvolver arritmias, caminhar mais tempo a um ritmo médio ou acelerado foi associado a uma redução de 27% no risco.
Por outro lado, convém referir que o estudo tem as suas limitações, principalmente devido ao facto de os dados terem sido auto-relatados pelos participantes e de não refletirem uma amostra amplamente representativa em termos de idade e diversidade étnica: a idade média dos participantes era 55 anos, 55% eram mulheres e 97% eram brancos.
Limitações à parte, problemas de ritmo cardíaco podem aumentar o risco de AVC, insuficiência cardíaca e paragem cardíaca, se não forem tratados. Pelo que estes novos dados representam uma evolução importante no sentido da prevenção. E com algo tão simples e económico quanto caminhar.
De resto, de acordo com o jornal britânico Guardian, os investigadores, liderados por Jill Pell da Universidade de Glasgow, concluíram o seguinte: "Este estudo é o primeiro a explorar os mecanismos subjacentes à associação entre o ritmo de caminhada e as arritmias, e a fornecer evidências de que fatores metabólicos e inflamatórios podem desempenhar um papel: caminhar mais depressa diminuiu o risco de obesidade e inflamação, o que, por sua vez, reduziu o risco de arritmia."